Lisboa e os seus bairros, as suas sete colinas, os lugares pitorescos, o rio Tejo que a envolve são cantados em muitos géneros musicais, mas o Fado é, sem dúvida, maioritário, seguindo-se as marchas populares, que saíram à rua a partir de 1932. Em cada ano, escrevem-se centenas de poemas sobre Lisboa, sempre lindos e diversos, que versam o mesmo tema, mas nunca se repetem. Este acervo iconográfico à cidade “musa inspiradora” não impõe limites à imaginação e criatividade dos poetas/letristas, tal é a sua beleza, e, curiosamente, muitos destes temas que são compostos para os concursos das marchas preenchem a métrica para Fado, passando a serem cantados nas músicas dos Fados tradicionais.
O Fado canta-se em tabernas e cafés de Lisboa há mais de 150 anos, desde o tempo em que Maria Severa – uma personagem lendária que viveu e morreu cedo demais para deixar gravações – cantava para o seu amante, o Conde de Vimioso. Foi uma relação amorosa que se tornou pública e que chamou a atenção para este género musical, pois o Fado era visto, e continua a sê-lo, como “a música dos abandonados do amor”.
Curiosamente, até aos anos cinquenta do século XX, os versos para Fados eram essencialmente escritos por homens para as mulheres cantarem, principalmente nas chamadas casas de fado: “Após alguns compassos da guitarra, a fadista começa a sua canção. Com a cabeça atirada para trás, os olhos semi-cerrados, expressão de arrebatamento, e o corpo oscilando levemente ao ritmo da música, a fadista canta com a voz curiosamente rude e não educada, e de um modo simples e despretencioso, que são ditados pela tradição.”
Na altura em que o gramophone chegou a Portugal, por volta de 1905, a música rapidamente se integrou na rotina diária, mas as gravações desse período eram confinadas às salas de concerto, situação compreensível se considerarmos que o fonógrafo era aparelho luxuoso, que só as classes mais favorecidas podiam adquirir. Foi só em 1920 que o verdadeiro espírito fadista foi capturado em goma-laca.