Edição de luxo em digipak com livreto bilingue (português, inglês) de 90 páginas a cores.
Desde o século XVI que os portugueses são conhecidos pelos seus navegadores aventureiros que pioneiramente sulcaram os mares até locais tão distantes como o Sudeste asiático, ou as Américas, estabelecendo impérios comerciais e subjugando, nesse processo, pequenas populações locais. Procurando monopolizar o lucrativo comércio das especiarias das Índias Orientais, os portugueses começaram por estabelecer a sua presença militar nas “Ilhas das Especiarias” (Spice Islands) de Moluku (as ilhas Molucas), logo no século XV (vide mapa). Bem cedo os espanhóis, os ingleses e os holandeses se juntaram na corrida pela supremacia do comércio da noz moscada, do cravinho e do sândalo nas Molucas. Porém, os portugueses foram os primeiros a implantar uma rede de fortalezas e de interpostos comerciais na região, inicialmente nas Ilhas das Especiarias de Ternate e Tidore, no norte das Molucas, mas também em Ambon e Ceram, nas Molucas centrais, nas Flores e em Timor, no sudeste, e em Muar (Península Malaia), Tugu (actual Jacarta), Makassar (hoje Ujung Pandang), no Sulawesi do sul e em Timor leste. Tal como esta selecção musical demonstra, a música viaja pelos caminhos percorridos por aqueles que a interpretam ou que a desempenham. Podemos mesmo falar em viagens de sons e traçar os seus itinerários através dos oceanos e dos continentes. Este disco, em particular, diz respeito não apenas aos sons dos viajantes portugueses mas também aos sons da tradição dos escravos africanos e sul-asiáticos que viajaram por intermédio dos portugueses. Tal como já ficou dito anteriormente, alguns escravos converteram-se ao cristianismo ficando conhecidos por Portugis ou por portugueses negros. Ao tomarem contacto com diferentes tradições, contextos e pessoas, estes sons foram absorvidos e fundidos através de processos geradores de novas e independents formas de expressão musical as quais vieram a definir diferentes identidades culturais. É neste enquadramento que podemos inserir alguns géneros musicais e estilísticos tais como o kroncong e o kapri, e algumas danças como a zapin acompanhada por música joget. Porém, a aparente unicidade cultural entre as várias regiões malaio-falantes do sudeste asiático, baseia-se não apenas no contacto cultural com os portugueses mas também no contacto com os indianos e os muçulmanos da Ásia ocidental. Assim, alguns géneros musicais que se crê terem origem num sincretismo entre as culturas portuguesa malaia, contêm elementos de origem malaio-árabe como é o caso do orkes gambus ou gambusan (contendo instrumentos de origem árabe tais como o alaúde gambus, Vide faixa 15), utilizado para acompanhar as danças malaias como por exemplo a zapin. Independentemente do modo como os elementos portugueses ou árabes se introduziram no universo malaio, alguns géneros musicais, como o kapri, o ronggeng, o orkes gambus, o stambul, o bangsawan e algumas canções e agrupamentos kroncong, constituem efectivamente uma síntese entre elementos portugueses e perso-árabes ou da Ásia ocidental. Hoje a música não é descrita pelos seus intérpretes ou pelas audiências como sendo portuguesa, pois, tal como é sabido, o poder português na Indonésia dissipou-se no início da era colonial. Em vez disso, a música é definida como música malaia, pelo que se tona importante perceber o significado dessa expressão.