Edição de luxo em digipak com livreto trilingue (português, ingles e indo-português) de 70 páginas a cores.
Os territórios da antiga Índia Portuguesa para além de Goa, onde podemos ainda encontrar tradições musicais, estão espalhados pela costa do Malabar, desde Diu, na península do Gujerate, até o porto de Cochim, no estado do Kerala. Com base em livros e estudos de linguistas, historiadores e viajantes do século passado, recuperámos exemplos vivos da tradição, entre as comunidades costeiras mais isoladas ou abandonadas, que incluem versos e canções crioulos indo-portugueses. A música neste CD invoca a literatura e a tradição oral da época das viagens Existe uma explicação para o declínio do dialect ou língua norteira de Diu: “…devido à escassez de material recolhido e classificado, como pelo progressive aportuguezamento a que o mesmo dialecto se foi subordinando n’estes últimos 20 anos… acabaram por lhe destruir toda a sua primitiva originalidade, dos quaes as principaes são a diminuição da população christã, a quasi fusão desta com o elemento goêz, a influência do ensino official e, em consequência, o successive desuso das formas glottologicas que eram a sua característica…” A Língua e a Música das Comunidades Indo-Portuguesas A música indo-portuguesa constitui um verdadeiro exemplo de sobrevivência, até ao presente, de uma cultura e de um dialecto “norteiro”, tanto na poesia, nos versos tradicionais, como na prosa e nos contos orais, que ainda se ouvem em Diu e Damao, na vila de Korlai, perto do antigo forte português de Chaul (Revdanda, Kolaba Dt.) e na paróquia de Nossa Senhora da Esperança na Ilha de Vypeen, em Cochin. Os crioulos indo-portugueses representam um sincretismo das suas fontes intercontinentais, no qual as contribuições europeias temáticas e léxicas se traduzem semioticamente num discurso euro-asiático.
O indo-português pode considerar-se paralelo ao português de Malaca, descrito por Ian Hancock como sendo europeu (léxico), africano (estrutura), e asiático (léxico e estrutura) (Hancock 1975). A influência dos cafres da África oriental, introduzidos, originalmente como soldados, pelos portugueses, através de Goa e conhecidos como «Kaf,» constitui um componente linguístico e cultural notável no crioulo indo-português. A dança, o amor, a gravidez, e a comida são alguns dos tópicos construídos pelos africanos da costa oriental e que enformam a visão do narrador da Ásia portuguesa. Nos territórios ocupados pelos portugueses na Índia, por vários séculos, há cada vez menos falantes activos do antigo dialecto crioulo indo-português. As importantes cidades-fortalezas de Baçaim e Chaul, entre outras, são hoje ruínas. Na Índia, a língua e a cultura crioula portuguesas difundiram-se na população miscigenada ao pé das fortalezas costeiras e deu mostras de grande vitalidade como língua usada no comércio, na religião e nas relações familiares em todas as comunidades fora de Goa. O crioulo coexistia com o português padrão, centrado em Goa, como língua de baixo estrato social. Os dialectos crioulos estão relacionados entre si, no entanto, partilham características trazidas de fora do subcontinente Indiano, adquiridas na carreira da Índia, designadamente as melodias e os textos de um cancioneiro popular indo-português. No porto de Damão, ainda hoje se pode ouvir um crioulo português semelhante ao crioulo norteiro descrito há mais de cem anos nos estudos linguísticos pioneiros de Hugo Schuchardt (1883) e Sebastião Dalgado (1903), e é falado por vários milhares de pessoas, como comprova a análise linguística de Clements (The Genesis of a Language, 1996).