Escolhas do João Afonso Almeida

João Almeida e Sakamoto

 

MÚSICAS – ESCOLHAS

 

Enquanto não chega a miraculosa vacina contra o covid 19, que virá a ser assim a modos que o mais especial e ambicionado presente de Natal ou então, se acaso ela só chegar no início de 2021 uma verdadeira prendinha de Ano Novo, temos que ir ocupando o tempo de algum modo e uma das melhores formas de o preencher será ocupá-lo com…música!

Por isso e porque “tristezas não pagam dívidas”, enquanto não surge a  tal miraculosa cura efectiva e também porque a vida continua, eis-me mais uma vez mais a propor-vos, não só a leitura de uma série de notícias sobre a cultura em geral nas notícias soltas, bem como dar conta de uma série de escolhas musicais, que representam uma grande fatia das mais recentes novidades discográficas surgidas em Portugal, propostas meramente pessoais, que espero sirvam para ajudar a seleccionar audições, consoante o gosto de cada um, tentando assim, à minha maneira ajudar  a passar melhor o tempo que ainda vamos tendo livre e a desanuviar um pouco das efectivas preocupações virais que nos vão assaltando os pensamentos e as ideias…

 

PEDRO BARROSO – o adeus dum trovador

Precisamente no mesmo mês em que cumpriria mais um aniversário natalício, despede-se de nós aquele que eu e muitos mais admiradores também, consideramos o ultimo grande trovador português- Pedro Barroso; porém este seu presente adeus será apenas em termos de cantorias e de gravações discográficas, porque, infelizmente, em termos físicos essa despedida já havia tido lugar em Março deste ano quando uma maldita doença de origem cancerígena,  o levou do nosso convívio na exacta altura em que fomos repentinamente assaltados por essa maldita pandemia viral que dá pelo draculiano nome de coronavirus.

Com efeito, acaba de ser publicado o projecto “Novembro…que rumos” que acabará por ser o ultimo grande grito de revolta literário, de um artista com A grande, social e politicamente coerente, combatente activo e solidário, amigo do seu amigo, tolerante, lutador indomável e sincero das causas da Liberdade, feroz denunciante das injustiças deste mundo, eterno apaixonado pelo seu País e pelas suas gentes, pela sua musica tradicional e também pela de expressão popular, área de que ele próprio era parte integrante e indissociável, um genial e inspirado cantautor dotado de uma voz única e singular, de pessoalíssimo timbre, brilhante e penetrante e acima de tudo um personagem que nunca virou a cara à luta mesmo que isso às vezes o pudesse prejudicar, que sempre disse o que entendia dever dizer, doesse a quem doesse e que, por isso mesmo vai deixar saudades, muitas e eternas saudades…

Recuando um pouco no tempo relembro agora que no princípio do ano transacto recebi um telefonema do próprio Pedro (com quem privaria mais demoradamente meses mais tarde no Coliseu dos Recreios de Lisboa, durante um espectáculo especial comemorativo dos 45 anos da revolução dos cravos organizado pela Associação 25 de Abril liderada pelo coronel Vasco Lourenço) dando-me conta de que apesar do seu frágil estado de saúde já nessa altura não lhe permitir fazer concertos ao vivo ou outra espécie de aparições publicas, pretendia no entanto levar por diante a parte final da gravação e  lançamento daquele que, segundo ele próprio me confidenciaria, seria o seu último disco em vida, pois os médicos que periodicamente o assistiam de perto, mesmo sendo generosos quanto ao tempo de que ainda dispunha, não lhe prognosticavam nessa altura mais de seis meses de vida; senti-me arrepiar e embora soubesse que ele estava há tempos a lutar estoicamente contra uma maldita doença terminal fiquei profundamente chocado com a noticia, ainda por cima transmitida de viva voz pelo próprio, e indaguei-lhe o motivo da sua chamada tendo-me ele confidenciado que desde sempre fora um grande admirador de Patxi Andion com quem chegara a privar por alturas de um dos primeiros programas televisivos na RTP- o “Zip-zip” em que os dois eram cantores convidados (o tal que afinal deu origem à primeira expulsão do cantor espanhol do nosso País pela sinistra polícia politica de então – a PIDE e que teve como  figura de entrevistado principal o grande Almada Negreiros) e um dos seus sonhos já desde essa altura era ter a participação do cantautor espanhol num dos seus trabalhos de originais e esta seria, em princípio, a derradeira grande oportunidade de isso poder vir a concretizar-se.

Como desde há tempos era eu o responsável por coordenar em Portugal todo e qualquer assunto ou pedido que surgisse para o artista espanhol, quer se tratasse de concertos, que depois posteriormente seriam organizados e geridos pela Uguru, quer para entrevistas ou para textos de opinião, prontamente assegurei ao Pedro que, conhecendo o meu querido “irmão” Patxi como eu conhecia, e embora  não tivesse ainda falado com ele podia desde já garantir-lhe o sim para essa solicitada colaboração, quer fosse para um dueto ou para a composição de um tema original…

Poucos dias depois na casa do Patxi em Madrid tive a já esperada concordância para essa colaboração que no entanto se resumiria a um dueto entre os dois numa composição da autoria do cantor português; depois de várias demarches lá se conseguiu terminar o tema que acabou por resultar num fantástico trabalho a dois, exemplificativo da alta qualidade poética e vocal de dois artistas consagrados que mais que glorificados em Portugal e Espanha eram nestes territórios dois artistas simultaneamente adorados, idolatrados e  acima de tudo…respeitados.

Essa composição vem incluída neste novo e derradeiro disco do cantor português que tal como o seu colega espanhol já desapareceu infelizmente do nosso convívio, um por motivo da tal maldita doença terminal, o outro vitimado por um estúpido desastre ocorrido numa manhã de Dezembro, invernosa e de nevoeiro na sua Espanha natal, quando ao volante do seu potente jeep de grande cilindrada foi acometido por uma doença súbita que o fez sair da estrada e autenticamente voar para o outro lado da carretera.

Com o desaparecimento destes dois verdadeiros “monstros” da musica popular e de autor dos dois países, é claro que a música ibérica ficou de luto e também incomensuravelmente muito mais triste e pobre; resta-nos porém agora uma pequena consolação que ajudará certamente a mitigar as enormes saudades que já todos sentimos desses dois homens de letras (curiosamente os dois “maestros” (professores) de profissão):- é que qualquer um deles deixou um longo legado  discográfico, brilhante e inesquecível, constituído por extensas discografias pessoais havendo porém agora no entanto ainda duas belíssimas surpresas reservadas para os seus milhares de admiradores que serão, do lado do cantautor espanhol o muito esperado segundo volume da comemoração dos seus 50 anos de carreira genericamente intitulado “Profecia”, que, em princípio, verá a luz do dia presumivelmente em meados do próximo ano e já estava totalmente gravado aquando do seu brutal desaparecimento ( o primeiro chamou-se “La hora lobican” e foi objecto de divulgação promocional em auditórios da FNAC e também em palcos nacionais de Águeda, da Casa da Música, do Porto e da Aula Magna, de Lisboa), e do lado do cantautor português  esta derradeira e verdadeira obra-prima registada em disco, genericamente intitulada “Novembro… que rumos” ,que está, como atrás já se disse, a ser editado entre nós em perfeita sintonia com a data do seu aniversário…

Neste novo e derradeiro projecto do antigo habitante de Riachos, no Ribatejo, poderemos então deliciar-nos logo na abertura do projecto com o tal único, inédito e esperado “encontro” musical entre os dois grandes “monstros” da canção ibérica que afinal de contas, e infelizmente, acabará por constituir também a sua triste e inesperada despedida do seu publico seguidor e fiel- o fabuloso, inspirado e por vezes arrepiante dueto “Que rumos”, que foi apresentado em primeiríssima mão no ano transacto aquando do desaparecimento do cantor português, no programa de TV “Inesquecível”, de Julio Isidro, na RTP Memória, uma brilhante composição, inspiradamente intemporal, profunda, nostálgica e interrogadora, mas acima de tudo verdadeiramente antológica, que constitui o mais que perfeito porta-estandarte musical e poético do projecto de despedida do nosso querido Pedro Barroso, que tal como o seu colega espanhol, ficará para sempre ligado ao que de melhor se fez em termos de música popular, tradicional e de texto nos dois grandes países ibéricos…

No disco vamos poder encontrar também algumas inspiradas composições, constituindo algumas delas os já habituais “recados” literários que Pedro nunca deixava de incluir nas suas obras a solo como são, nomeadamente, “Livro de reclamações”,”Foge”, “Sim, sabemos” ou “Portugal”, este último, uma canção verdadeiramente memorável que traça nesta pequena resenha musical uma mini-história do nosso País natal, que afinal de contas tanto amamos, mas que amiúde nos desgosta, trai e desilude, partidariamente falando é claro!!!

Uma palavra final para “A última porta ao fundo” a canção que fecha o disco onde o cantor português continua a exercitar o seu grande sentido critico e que soa assim a modos que uma consciente, mas amarga despedida de um brilhante constructor de canções que afinal ao longo dos seus 50 anos de carreira(que coincidência com a mesma efeméride do cantor espanhol!) nos deu o melhor de si mesmo em termos de clarividência, criatividade musical e literária e acima de tudo de…talento!

Lá, no etéro onde estiverem, depois dos muitos concertos, a solo ou a duo, que ambos certamente darão, que grandes festanças eles farão no final, todas bem regadas a altas copofonias e a engalanar lautas comezainas; já agora, e se não for pedir muito, vão aí esperando por nós, porque essa grande travessia que vocês já fizeram é afinal o que todos temos de fazer  nesta vida, mais cedo ou mais tarde!

 

   

CD Ovação com apoio SPA

 

BUBA ESPINHO – a grande revelação do fado!  

Confesso que quando pela primeira vez o ouvi  fiquei completamente “apanhado” pela musicalidade, uma já certa maturidade vocal e pela peculiar maneira de cantar, de uma jovem promessa do nosso cada vez mais habitado mundo fadista, que dá pelo singular nome de Buba Espinho!!!

Efectivamente, dono de uma belíssima voz, afinada, de personalidade bem própria, timbrada e singular, Buba canta com grande sentimento e segurança, demonstrando um domínio perfeito e correcto do português,  (coisa bem rara hoje em dia até em alguns dos chamados “consagrado(a)s” que às vezes em vez de projectarem as palavras antes parecem comê-las) e que nascido em Beja, no profundo Alentejo, parece, pela sua humildade e simplicidade , mais não pretender de momento senão dar-se a conhecer ao grande publico, projectar-se minimamente e tentar conseguir mais tarde o seu lugar ao sol !

Ao que se sabe, somente por volta dos 15 anos começou a interessar-se por musica mais a sério quando o bichinho do cante alentejano lhe tocou fundo na alma e despertou em si capacidades e vontades, que se calhar nem ele próprio sabia ter, e acima de tudo porque certamente os “genes” do pai começaram a falar mais alto, até porque é filho de Luís Espinho, que fez parte dos meus  grandes amigos Adiafa, grupo com quem trabalhei na Sony Music, isto para além de feito parte dos Mestre Dante e do Baile Popular e ter averbado colaborações com as Vozes do Cante e com a minha querida e já saudosa Celina Pereira, grande cantora cabo-verdiana, infelizmente agora subtraída por uma maldita doença ao nosso convívio.

Após despertar para a música, e logo desde essa altura, começou por integrar agrupamentos a que o seu progenitor pertencia, formando pouco depois o seu próprio grupo musical,  até que resolveu traçar o seu próprio percurso a solo e, quando o fado lhe surgiu pela frente, aconteceu um “click” que constituiu um verdadeiro “amor à primeira vista”!

Depois, já decidido a enveredar por ele começou então uma peregrinação pessoal pelos meandros do fado, que se traduziu numa intensa pesquisa pelo seu riquíssimo espolio; daí às casas nocturnas, onde ele é cantado e venerado, foi um saltinho, até que de repente se viu a participar, e a vencer, a Grande Noite do Fado em 2016…

Foi a sua grande rampa de lançamento para uma carreira auspiciosa, que agora tem outro degrau ultrapassado após o lançamento físico de um primeiro disco que leva o seu nome como título –“Buba Espinho“ , e onde teve como convidados António Zambujo, Raquel Tavares e Tiago Nacarato, entre outros .

Cantando neste disco de estreia, onde merece destaque a excelência dos  instrumentistas e a eficiente produção, nomes conceituados como o do seu conterrâneo António Zambujo, Paulo Abreu Lima, Fernando Fontes, Armando Torrão ou João Monge, entre outros, Buba ousou mesmo já até arriscar na área da composição, assinando a música e a letra de uma bela canção -(“Menina”) e por esta sua amostra estou convencido que no futuro, também nesta área poderá surpreender positivamente muita gente; o jovem e já mais que promissor fadista, que no reportório do projecto se desdobra por fado e canções, continua no entanto ligado umbilicalmente ao laureado cante alentejano, que constitui para ele uma grande e natural inspiração e motivação, factores que são perfeitamente compreensíveis tanto mais que o Alentejo, onde nasceu, foi e é uma fonte natural de influencia e sedução.

Afirmando-se, vocal e geograficamente de musicalidade e raiz alentejanas, dono de grandes potencialidades pessoais e de uma natural e inquestionável identidade fadista, Buba Espinho é sem duvida a grande revelação do fado no masculino neste ano de pandemia, uma voz que vai surpreendendo em cada tema do seu disco de estreia, onde deslumbramento, cumplicidade, intimismo e paixão, andam de mãos dadas para se ter obtido um resultado final de grande brilhantismo  e  excelência vocal, rumo a um futuro merecido…sucesso!       

CD Ruela Music/Parlophone/Warner Music

 

ANDRAS SCHIFF/JORG WIDMANN – deslumbramento

Dois grandes instrumentistas reuniram esforços, gostos musicais, vontades e talentos e conceberam “Johannes Braams – clarinet sonatas”, um projecto que nos proporciona um contacto profundo com a musica de Brahms, neste caso concreto as ultimas sinfonias do compositor -as sonatas para clarinete (op.120, nºs 1 e 2) escritas por alturas de 1894 e ainda com “Intermezzi for piano” composição escrita propositadamente para o piano de  Andras Schiff pelo próprio clarinetista e compositor que assina com ele o projecto, onde a ligação piano/clarinete é perfeita, numa grande comunhão de gostos e ideias que é fruto da profunda admiração e amor que ambos nutrem pelo compositor alemão,  um dos maiores compositores do romantismo musical do século IXX , que nascido em Hamburgo em 1833 acabaria por falecer em Viena, na Áustria, no ano de 1897.

Verdadeira alquimia musical, intimista e  obra de grande cumplicidade e intensidade é, sem favor, um dos melhores trabalhos de música erudita do ano!   

CD ECM/Distrijazz

 

MICHEL BENITA – paisagens sonoras

Recheado de grandes atmosferas rítmicas, envolventes, contemplativas e de grande sensibilidade  sonora ”Looking at sounds”, é acima de tudo um verdadeiro tratado de jazz, no melhor sentido do termo, em que quatro grande músicos, todos exímios instrumentistas, dialogam entre si, apresentando-nos como resultado final um grande disco, sublime, enérgico, atractivo, consistente e… equilibrado!

Acompanhado por Matthieu Michel, Josef Dumoulin e Philippe Garcia o líder do projecto – Michel Benita, ao mesmo tempo que se revela um belíssimo compositor, propõe-nos aqui onze inspiradas composições, sendo a maioria esmagadora da sua própria autoria, que se constituem ao mesmo tempo como uma mão cheia de intensas e deslumbrantes paisagens musicais, de uma grande subtileza sonora e sensibilidade e que mais parecem obras saídas de um compendio de… magia.

CD ECM/Distrijazz

 

ROLANDO VILLAZON & XAVIER DE MAISTRE – serenatas com harpa

A junção  feliz de uma voz de tenor, absolutamente soberba como é indubitavelmente a do magistral e já lendário cantor mexicano Ricardo Villazon, com a sonoridade muito peculiar da harpa do francês Xavier de Maistre, num projecto de reportório totalmente latino, criou para as 21 composições escolhidas para o disco uma atmosfera musical absorvente e de deleite que encanta mesmo os mais exigentes ao proporcionar às canções, não só uma atmosfera única, mas também uma outra impensável vida, constituindo-se  ao mesmo tempo como uma verdadeira obra prima e, por isso mesmo um histórico projecto; com efeito “Serenata latina” é na verdade mais que somente um grande disco de reportório latino, pois sendo uma obra de invulgar qualidade, quer vocal, quer instrumental, acaba também por se consagrar como uma verdadeira celebração musical  do riquíssimo reportório da América Latina, que como costuma dizer o próprio tenor vai muito mais para além de “La cucaracha”, tanto mais que recria aqui várias canções que fazem parte do nosso imaginário romântico como são sem dúvida”, entre outras.

Disco, que nos permite o encontro com um reportório escolhido a dedo que beneficiou de especiais arranjos, criados com a finalidade de melhor servirem este dueto entre uma voz humana e um secular instrumento, onde se explora o manancial do rico e intemporal reportório latino, aqui sugerido de forma única e exemplar através de um conceito musical deveras invulgar; um trabalho que nos mostra, para alem de tudo, como pode haver uma interligação perfeita, e por vezes quase diria celestial, entre uma voz e uma harpa, ingredientes que acabam por resultar num projecto invulgarmente brilhante e num grandíssimo disco que é um sublime deslumbramento!

CD Deutsche Grammophon/Universal Music

 

TUGAN SOKHIEV – direcção exemplar

A obra do grande Dmitri Shostakovich (1906-1975) pela sua qualidade impar tem sido objecto de várias interpretações por parte dos mais variados maestros e orquestras, que a ela tem dedicado uma atenção especial não só em concertos ao vivo, mas também, e consequentemente, em várias gravações discográficas; por isso mesmo, é agora de novo objecto de uma revisitação, desta vez por parte do célebre maestro soviético Tugan Sokhiev, que conta no seu currículo pessoal com brilhantes contributos não só à frente da célebre orquestra  do Teatro Bolshoi, de Moscovo, como também ultimamente na direcção da Orquestra Filarmonica de Berlim.

Neste seu mais recente disco -“ Shostakovich- symphony nº 8” , o grande maestro/conductor assume a direcção da Orchestre National du Capitole de Toulouse, e mais uma vez excede as expectativas dirigindo-a superiormente e tratando a obra do compositor russo como ela realmente merece:- com enorme desvelo, grande criatividade e um amor sem limites, concedendo-lhe assim uma enorme amplitude e confirmando-a como uma obra de rara beleza e sedução e, acima de tudo, afirmando-a como a definitiva consagração dum genial compositor!

CD Parlophone/Warner classics/Warner Music

 

JOHN SCOFIELD – um mago da guitarra

Falar de John Scofield é sinónimo de se falar de um dos mais portentosos guitarristas de jazz da actualidade, de um músico com uma vida inteira dedicada à música e um talentoso instrumentista com uma larga carreira e uma extensa discografia no activo.

Em “Swallow tales”, recentemente editado, vamos encontrá-lo na companhia de dois grandes talentos também– Bill Stewart, na bateria e Steve Swallow, no baixo, uma composição em trio que será provavelmente a melhor e mais coesa formação em que tocou até hoje; este novo projecto, brilhante por sinal,  serve de celebração e simultaneamente de homenagem ao seu grande amigo e mentor Steve Swallow, companheiro de longa data e de muitas aventuras musicais.

Disco com composições marcadas por evidente grande beleza, por vezes inovador e  intimista, e acima de tudo com grandes melodias que mais parecem verdadeiras pinceladas musicais numa tela recheada de sofisticação, é também uma prova  instrumental de grande versatilidade e   virtuosismo; por isso mesmo, arrisco-me a dizer que provavelmente estaremos em presença do melhor disco do grande instrumentista que é sem dúvida John Scofield!

CD ECM/Distrijazz

 

MANUEL JOÃO VIEIRA – fado com humor

Geralmente quando é abordado o tema fado, muitos dos que habitualmente são conhecidos por ”entendidos”, e até também mesmo algumas das vozes do próprio panorama fadista  teimam, quanto a mim leviana e erradamente, em classificá-lo em apenas duas áreas distintas- numa delas o fado de Lisboa e do Porto  e noutra o fado de Coimbra, embora os naturais da cidade do Mondego e os estudantes, que por lá passaram pelas “repúblicas” e pela  Universidade, se refiram a ele, afirmando mesmo que assim é que a designação está correcta:- pura e  simplesmente como a “canção de Coimbra”, desdenhando sempre por isso o epíteto de fado para classificar a canção da cidade e dos estudantes; o próprio José Afonso e o imortal guitarrista Carlos Paredes sempre se lhe referiam assim também!

Onde está então o erro que atrás referi? No simples facto de que há uma vertente do fado português que sistematicamente teima em ser ignorada, talvez porque é muito antiga, desde há anos caiu em desuso, se calhar porque nunca foi beneficiada pelo marketing ou agraciada pelo sucesso de popularidade que grandes vendas sempre justificam e proporcionam.

É o chamado fado humorístico, normalmente associado a classes mais baixas da população, com menores recursos e que por isso mesmo criaram para si um fado próprio para poderem dizer certas verdades de modo mais ligeiro, mais alegre e mais brejeiro, sendo este também geralmente conectado com algumas figuras típicas locais, algumas delas de muito

duvidosa aceitação e reputação de quem se contam nas canções as vidas, a reputação, as histórias ou tragédias mais ou menos cómicas, etc.; entre os nomes que quanto a mim melhor representam o “movimento”, os que mais aprecio e admiro, estão sem dúvida a norte, o incrível Neca Rafael e a sul, o impagável  Joaquim Cordeiro, qualquer um deles fadista de mão cheia com longa discografia, popularidade e…algum proveito.

Longe vão os tempos em que eu e alguns amigos, todos ainda sem idade legal para penetrar no “seio” das casas nocturnas da altura, nos postávamos à porta da  velhinha Candeia, na rua do Almada, no Porto para rirmos à gargalhada com as letras dos fadunchos de …Neca Rafael. Bons tempos!

No entanto, se hoje em dia, por interesse ou mera curiosidade, alguém decidir procurar algum disco deste tipo de fado, somente, e talvez só eventualmente, o consiga encontrar em antigas edições de 45 rpm e quase sempre em alguma das temporárias feiras de vinil, geralmente organizadas por particulares um pouco por todo o país, ou então nas feiras de velharias Vandoma, no Porto ou na lisboeta Feira da Ladra ( um dos locais de maior predilecção consumista do “artista” deste disco) e em caso afirmativo isso será um verdadeiro achado pela sua raridade.

Por tudo isto que atrás ficou dito mais me apraz registar o aparecimento no mercado discográfico nacional de um CD duplo – “Anatomia do fado”, que é inteiramente dedicado às letras humorísticas  e que o Museu do Fado em boa hora resolveu patrocinar depois de uma exposição de pintura com  motivos fadistas que lá teve lugar há tempos atrás; nele vamos encontrar a voz do autor dos quadros expostos – Manuel João Vieira, antigo ponta de lança de projectos musicais como os Irmãos Catita ou os Ena Pá 2000 (os mesmos do sucesso “Pão amor e totobola”) que no projecto “faz de conta” que canta fado, interpretando nada menos de 32 composições, duas delas originais, algumas da autoria de Joaquim Cordeiro e uma do citado Neca Rafael, sendo isto quanto a mim uma grandessíssima injustiça pois o nortenho é de longe o “maior” cantador de fados humorísticos, área em que estudou, sem dúvida se formou e acabou douturado!

São quase duas horas de total achincalhamento, onde canções desbragadas falam de bois, mortalhas, freiras, milionários, avarentos,  preguiçosos, fascistas, caloteiros e até de anarquistas, num projecto que afinal de contas é todo ele recheado de sarcasmo, momentos hilariantes, anarquia a rodos, descaramento e cinismo, afinal ingredientes que se saboreiam muito bem nestes tempos loucos de pandemias, vacinas, confinamentos e outras panasquices afins…

Ficaram de fora do “cansativo” alinhamento, cantigas de teor pornográfico, que o autor  geralmente só deita cá pra fora nos seus espectáculos ao vivo; por isso, quem quiser mais histórias com muitos e prolongados “pis” é só preparar uns trocados e comprar bilhete para se rir, ao ver ao vivo o grande e habitual “comparsa” fadista, que de vez em quando até aparece como presumível candidato à presidência da republica (palavra de honra que eu votava nele!) que neste trabalho se desunhou p´ra cacete assinando também no apelativo projecto as ilustrações, inclusivamente a, por demais atraente e “sugestiva” capa!!!

CD Museu do Fado

 

VIKINGUR ÓLAFSSON – piano em ascenção

A Islândia, uma das mais deslumbrantes terras do sol da meia noite, berço abençoado do fiel amigo-o bacalhau, terra de mil erupções e paisagens de cortar a respiração, que não deixam ninguém indiferente, não é só bela, gelada, apaixonante e geologicamente vulcânica, como é também a origem de nascimento de algumas contemporâneas grandes vozes e muitos instrumentistas de talento; quem não recorda por exemplo a famosa cantora Bjork ou grupos como os Sugarcubes ou Sigur Rós?

Pois este mesmo país polar, é também berço de nascimento de um genial instrumentista que dá pelo nome de Vikingur Olafsson, toca piano e tem estado na berra fundamentalmente pelo seu enorme virtuosismo e  por recentemente o celebre New York Times o ter posto nos píncaros, por ocasião da edição de  um disco da sua lavra pessoal; agora o instrumentista volta a ser noticia pelo facto de ter sido editada uma bela caixa “Triad”, contendo três diferentes projectos :- um dedicado à música do minimalista Philip Glass, outro à de Johann Sebastian Bach e um terceiro dedicado à música de Debussy e Rameau, discos em que o músico islandês concede a sua própria e pessoalíssima leitura da música originária  daqueles renomados e talentosos compositores que no entanto já tinham sido por ele propostos e editados disco a disco; aclamados pela critica na altura da sua edição com a chancela pessoal de Vikingur Olafsson, saem agora em conjunto numa atractiva caixa, notando-se no entanto que existe nesta edição uma verdadeira alquimia, deveras apaixonante, entre as três diferentes  obras que aqui completam uma trilogia onde o musico e compositor islandês presta homenagem aos visados, ao mesmo tempo que neles nos propõe uma série de arranjos seus, experimentais, inovadores e intemporais que deste modo vem ainda valorizar mais a já de si cuidada edição.

Acresce ainda a particularidade valorativa de Vikingur ter feito questão de acrescentar em cada disco as suas próprias notas originais bem como pequenos apontamentos sobre cada um dos três diferentes discos.

Que excelente  homenagem instrumental e que bela prenda de Natal para apreciadores , melómanos e fieis admiradores de algum dos quatro grandes renomados compositores, visados nesta pessoal viagem musical pelos domínios da musica erudita.

Caixa de 3 CDs DGG/Universal Music

 

M.WASILEVSKY TRIO & J. LOVANO – quarteto soberbo

É sem dúvida uma figura incontornável e um dos mais talentosos, ou até talvez o melhor saxofonista tenor da actualidade jazzística mundial, e por isso mesmo qualquer novo projecto, que integre ou lidere, é sempre motivo de grande entusiasmo e da minha particular atenção, tanto mais que sou um dos seus mais incondicionais admiradores não só pelo conhecimento que tenho da sua obra a solo ou de colaborações, mas também pela simpatia que irradia e faz questão de demonstrar pessoalmente (memorável a sua prestação de há anos atrás no Funchal Jazz); pois o seu nome surge agora ligado a um projecto extremamente ambicioso em que aparece a integrar o habitual trio do pianista checo Marcin Wasilewski, passando o trio deste modo a quarteto e juntos arrasam, não só  pela alta qualidade das suas prestações, mas também no capitulo da composição pois assinam entre todos  a quase totalidade das composições, com excepção de apenas duas que levam a assinatura da grande Carla Bley.

“Arctic riff”, título do projecto, passa assim de repente a ser um objecto muito desejado, um disco que contem uma mão cheia de belas composições,  instrumentalmente profundas, onde a improvisação colectiva marca pontos e onde se nota, por vezes também, um acentuar do lado mais experimental de cada um dos intervenientes, qualquer deles também evidenciando estar em grande forma e constituindo-se assim esta união como uma fabulosa reunião onde Lovano brilha a grande altura, praticando o quarteto um jazz elegante e de excelência, onde todos combinam na perfeição para conseguirem o brilhante resultado final:- um jazz de vanguarda, coeso, apurado e esteticamente sofisticado.


CD ECM/Distrijazz

 

RODRIGO COSTA FELIX-fado intemporal

Longe vão já os tempos do projecto “Alma nova”, disco em que participou  juntamente com mais duas vozes do fado –Maria Ana Bobone e Miguel Capucho, em que aparição do trio foi de tal modo entusiasmante que acabou sendo considerada  como “novo fado”; agora, muitos concertos ao vivo volvidos, em Portugal e no estrangeiro onde na realidade já correu mais de meio mundo, mil e uma noites mal dormidas por causa das muitas actuações nocturnas em casas de fado, que quer se queira, quer não, são afinal a grande universidade da canção nacional por excelência e com vários discos a solo no seu activo bem como uma série de galardões a adornarem-lhe as prateleiras das vitrines em casa, Rodrigo Costa Félix, talvez o mais peculiar e tradicional fadista nacional da actualidade está de volta às gravações com “Tempo”, um disco que marca um momento alto na sua carreira, pois apresenta-se com uma maturidade vocal invulgar, com a voz maturada pela grande experiência já adquirida e por isso mesmo cantando melhor que nunca, com uma dicção do português perfeita e acima de tudo, dando razão aos que, como eu próprio  também amiúde  foram reclamando pelas suas prolongadas ausências das gravações de estúdio.

Sempre investindo de disco para disco, na pesquisa de poemas e textos mais densos e menos directos, todos eles no entanto de elevada qualidade, temas que ele no entanto tem tratado sempre com grande  respeito, amor e carinho, bem como na abordagem de diferentes novas sonoridades e referencias (no novo projecto o tema de abertura tem sabor, ainda que mesmo superficialmente, ao ritmo e balanço do flamenco espanhol) o fadista tem sistematicamente aprofundado e desenvolvido também algumas das suas capacidades próprias nomeadamente a sua veia pessoal de letrista, tendo mesmo neste disco colocado a sua assinatura em nada menos de 50%  do reportório literário total; na restante percentagem vamos encontrar gente  com algumas provas dadas no fado bem como dois nomes já com larga experiência e exposição fadista como são os casos de Tiago Torres da Silva ou José Fialho Gouveia.

Com uma  produção de indesmentível qualidade a cargo de uma improvável dupla/revelação (Rodrigo Costa Félix e Tiago Torres da Silva) a que um naipe de excelentes instrumentistas concede grande amplitude e independência, conseguindo que as  melodias brilhem por si  próprias,  chega-se facilmente à conclusão de que o fadista está talvez no seu melhor momento vocal de sempre, começando a discutir e a reclamar, perante outras vozes mais “marketizadas”, um lugar mais destacado e evidente na lista das melhores vozes masculinas do fado!

Recordo agora com certa saudade o que me dizia o meu querido amigo João Ferreira Rosa, que infelizmente nos deixou já há tempos atrás:- “…A grande verdade é que o Costa Félix tem o fado dentro dele e isso é uma coisa de que nem todos se podem gabar…”

Uma palavra final para realçar a excelência de dois temas soberbos e de grande inspiração que por si sós já mereciam a audição e  compra deste novo trabalho:- “Redondilha”  e “Lisboa é assim”, dois momentos realmente admiráveis que sem dúvida enriquecem a actualidade fadista nacional!

Fico agora à espera de poder ir escutar ao vivo este fadista notável até porque Lisboa tem mais encanto quanto se ouve o fado tradicional e especialmente quando se ouve cantar Rodrigo Costa Félix!

CD Edição de autor/Fado world/Rock*CD records

 

LUAR NA LUBRE-no Caminho de Santiago

Quando se fala em música celta com origem na linda Galiza, entre os vários nomes que afloram, um surge destacado:- o dos Luar na Lubre, grupo de música popular e tradicional, que cultiva e desenvolve a seu bel-prazer todas as influencias da musica de raiz celta e galega e muitas vezes as reinventa e projecta segundo as suas próprias concepções; banda já com um invejável currículo e uma longa e valiosa discografia, ocupa geralmente o sempre apetecido lugar de cabeça de cartaz nos mais diversos festivais por onde tem passeado a sua arte musical um pouco por esse mundo fora, onde já actuou em mais de trinta países e com isso vai granjeando cada vez mais adeptos e uma plêiade imensa de admiradores fieis e incondicionais.

E é precisamente este famoso agrupamento galego que volta a ser noticia pelo facto de ter acabado de editar mais um disco intitulado “Vieiras e vieiros- histórias de peregrinos”, que como o próprio título facilmente deixa antever trata na sua génese de toda a problemática, experiencias sensoriais e vivencias religiosas que envolvem o célebre percurso designado por “Caminho de Santiago”, que anualmente arrasta multidões até Compostela, e especialmente até à sua famosa Catedral, seja em cumprimento de algumas promessas anteriormente feitas, seja na procura de uma espiritualidade interior ou até mesmo na tentativa de melhor aprofundar e compreender toda a problemática que envolve não só o citado itinerário pedestre, mas também o Santo, a quem se atribuem grandes e divinos poderes e que lhe está desde tempos ancentrais íntima e umbilicalmente associado:-  Santiago de Compostela.

E se em termos de textos, neste novo trabalho, dedicado a todos os muitos milhares de peregrinos do citado percurso pedestre, afinal os grandes impulsionadores e inductores deste projecto, os membros do agora octeto musical, cuja formação  remonta a 1986 na Corunha, dão continuidade a uma tradição que tem já a sua marca indelével, de grande riqueza literária, não só no que ao conteúdo das letras das canções diz respeito, mas, aqui e agora, também nos pequenos textos explicativos que acompanham cada canção e resumem através duma ligeira e histórica explanação o conteúdo temático de cada composição, em termos musicais e sonoros o grupo continua na senda de só lançar projectos de elevada envergadura melódica e sonoramente sedutores traduzidos por uma grande inspiração e maestria, condimentos de que afinal o grupo foi dando mostras ao longo de um percurso impar numa já longa carreira de 18 discos e mais de 1.500 espectáculos…

Entretanto perfazem-se agora três décadas de uma notável trajectória em que a banda da Galiza procurou mais do que tudo dar a conhecer a música e cultura galegas sempre explorando continuadamente novas sonoridades, sem no entanto neste capítulo abdicarem da génese celta tal como acontece no presente projecto em que se debruçam sobre escritos, lendas, mártires, sonoridades, sacrifícios e algumas incríveis histórias de peregrinos abarcando diversas épocas, vozes e contextos.

Um projecto brilhante, a roçar o epíteto de obra-prima, que acaba por constituir um marco muito importante na história da musica de inspiração folk/celta, vem relançar e publicitar ainda muito mais (como se isso fosse preciso !) o célebre Caminho de Santiago, toda a sua história ancestral, romeiros, problemática, sentido, origens e consequentes reflexões;  uma chamada de atenção final para o facto de o projecto  trazer ainda como bonus um segundo disco contendo uma “viagem” instrumental e sonora, verdadeiramente inolvidável, pela discografia do grupo e que constitui por si só uma fantástica  compilação que só por si já valeria a pena a compra!

Para os verdadeiros amantes das músicas do Mundo uma sempre ideal e cobiçada prenda de Natal …

2CDs  Warner Music

 

SONS DA TERRA – pequenos/grandes livros

Infelizmente a cultura em Portugal é, desde há muito tempo, assim a modos que uma filha enjeitada de tal modo que aqueles que a deviam acarinhar e proteger e até, quando fosse caso disso, a subsidiar, são os primeiros  muitas das vezes a ignorá-la e a esquecer-se dela, quem sabe se porventura muitas delas propositadamente ou não…

Por isso vão cada vez mais valendo e restando as iniciativas individuais, que, remando contra ventos e marés lá vão de quando em vez levando a água ao seu moinho  arriscando quase sempre o seu pecúlio monetário em prol de um prazer pessoal de realizar umas quantas edições, quer discográficas (aqui o alheamento  das majors já ocasionou um crescimento brutal de edições de autor, pagas obviamente pelos seus autores), quer literárias, onde colocam todo o seu saber e experiência em prol da dita cultura que assim vai vivendo aos solavancos, ao sabor de eventuais apoios, quase sempre, felizmente, vindos de Câmaras Municipais, que quando existem constituem como que uma espécie de bolha de ar que vai “alimentando” e ajudando a respirar e muitas vezes sobretudo a sobreviver, através de pequenas edições, alguns eventuais empresários e algumas micro-empresas.

É o caso, por exemplo da nossa Tradisom, que existe através da iniciativa individual, monetária, saber acumulado, exemplar labor e profissionalismo de José Moças, que, a expensas suas,  tem editado e colocado no mercado algumas belas obras literárias e discográficas (Brigada Victor Jara, Por terras do Zeca, Júlio Pereira, Amália, etc.) e até videográficas (Michel Giacometti, Tiago Pereira) dos últimos anos em Portugal e também de uma pequena editora sediada em Sendim – a  Sons da Terra, de Mário Correia, musicólogo, investigador do IELT (Universidade Nova de Lisboa) e membro da Academia de Letras de Trás-os-Montes, que possui já no currículo da sua pequena firma um extenso catalogo de mais de centena e meia de títulos lançados, bem como edições  discográficas de recolhas musicais da tradição oral portuguesa; Mário Correia foi há anos atrás uma das figuras preponderantes no Festival Intercéltico do Porto, de boa memória, e é também  actualmente o fundador e director do Centro de Música Tradicional Sons da Terra, que desde o ano 2000 organiza anualmente e com grande sucesso o habitual Festival Intercéltico de Sendim.

No capítulo dos lançamentos literários, especificamente dedicados à música portuguesa damos hoje noticia da edição de quatro livros da sua própria autoria, três deles dedicados à figura impar do grande criador de “Grândola,vila morena”- José Afonso – “A raiz genuína”, “Palimpsesto sobre vampiros, eunucos, chacais & outras bichezas e figurões na obra e na vida de José Afonso” e “José Afonso andarilho nas Astúrias” e um quarto livro dedicado ao imortal Adriano Correia de Oliveira, o homem que primeiro apostou em nos dar a conhecer em Portugal a grande poetisa galega Rosalia de Castro– “A cantar os poetas livres e úteis”, obras que agora e aqui recomendo sem reservas, pela sua grande qualidade e também porque não existem no mercado livreiro nacional assim tantas edições que abordem a vida e obra de qualquer um destes dois expoentes máximos da canção de texto portuguesa, que foram, antes da revolução dos cravos, duas das principais vitimas da maldita censura prévia na altura das suas edições discográficas em especial as de origem na célebre editora Arnaldo Trindade, de boa memória.

Quatro belas prendas de Natal que os melómanos de livros e de música vão certamente apreciar e agradecer!

Livros:- Sons da Terra

 

MARIZA – Amália na voz

São na realidade duas vozes de excepção, ambas conseguiram atingir um alto patamar de popularidade e fama e, curiosamente,  tinham em comum o Fado, o tal imortal património português, eterno e universal que a UNESCO já dimensionou mundialmente para outros patamares e se tornou o mais importante ex-libris do Portugal de Abril contemporâneo, país nos últimos anos, infelizmente,  invadido por ”resmas” de turistas chegados na sua grande maioria em “low costs” de avião e em barcos de cruzeiro, que sujam as ruas, lotam as casas de fado típicas e se banqueteiam com sardinhas e tintol, devoram pasteis de nata, se passeiam pela Feira da Ladra e similares, sem quase sempre nada comprar, e partem depois bem abastecidos, carregados de garrafas de vinho generoso do Douro e conservas depois de, qual alcateia sedenta de Sol, terem ocupado belas praias onde nos “presentearam” deixando beatas de cigarros, latas e garrafas vazias e outros detritos de poluição afins…
Recuando um pouco no tempo quando Mariza partiu à conquista do Mundo e começou a conquistar públicos que, antes, só Amália tinha conseguido arrebatar, já a canção nacional por excelência estava num alto patamar mercê sobretudo de alguns dos artistas que o tinham já conseguido popularizar além-fronteiras nos inúmeros espectáculos por lá deram tais como, entre outros, Carlos do Carmo, Carlos Paredes e… a imortal e divina Amália Rodrigues.

Entretanto sabe-se que quando Mariza começou a explorar outros caminhos contíguos ao Fado, fê-lo como antes só Amália o tinha conseguido, especialmente quando chamou para assumir a produção de obras suas um homem que eu próprio lhe apresentara num dos camarins da VC em Paço d´Arcos aquando de uma presença dele a acompanhar Ryuichi Skamoto num dos programas televisivos de Herman José:- o violoncelista, braço direito na produção, arranjos e fiel “escudeiro musical” e acompanhante do grande  Caetano Veloso – Jaques Morelenbaum…

Chegados a 2020, o ano do injusto confinamento  originado pelo maldito coronavirus, não admirou, nem foi surpresa para ninguém, que face à grande admiração que sempre nutriu pela voz número um do Fado, Mariza surja agora a homenagear a grande Diva; e esse tributo chega mesmo por inteiro porque o disco “Mariza canta Amália” é inteiramente preenchido por dez canções que Amália já anteriormente gravara tais com o “Povo que lavas no rio”, “Barco negro”, “Com que voz” ou “Estranha forma de vida”, entre outros.

Recentemente a fadista havia até afirmado:- “…Amália é uma inspiração maior, não só para mim, mas para tantos artistas portugueses e ainda muitos outros internacionais, assim como para todos os portugueses ; como diria o grande António Variações: -«todos nós temos Amália na voz».

Neste disco, com guitarra e  viola, como é apanágio do fado, mas também com orquestra, como Amália provou há muitos anos atrás isso ser possível quando gravou entre outros com o célebre Norrie Paramor, a fadista portuguesa nascida em Moçambique, dá-nos a pessoal versão da “sua” Amália num projecto com arranjos e direcção de orquestra do citado Jaques Morelenbaum, que assim reencontra Mariza precisamente quinze anos depois de lhe ter produzido o bem sucedido álbum “Transparente”…
Mariza desde sempre cantou Amália – logo no trabalho que a revelou “Fado em Mim” (2001), já reinterpretava “Barco Negro” ou “Oiça Lá ó Senhor Vinho” e também ao longo dos seus sete trabalhos de estúdio e três registos de concerto anteriores, várias vezes gravou reportório da diva; no entanto esta é a primeira vez que dedica todo um álbum ao seu reportório onde as composições surgem ornamentadas com novos matizes e, dos dez temas escolhidos para este novo projecto, ela apenas anteriormente se abalançara a cantar um – “Barco Negro” que tal como os restantes nove surge agora com uma leitura orquestral em gravações que tiveram lugar entre Lisboa e o Rio de Janeiro, num reencontro entre um reportório inesgotável e uma voz imortal de uma figura impar do Fado que descansa no Panteão Nacional e ocupa também um lugar à parte na Olimpo dos deuses da música…

CD Taberna da Música / Parlophne / Warner Music

KEITH JARRETT

Faz das teclas do seu piano o instrumento ideal para nos fazer meditar e sonhar  e da sua arte sublime o veículo com que facilmente nos arrebata e seduz; longe vai já o tempo da sua presença entre nós no célebre Festival de Jazz de Cascais , no infelizmente já desaparecido Pavilhão do Dramático de Cascais quando o seu brilhantismo jazzístico já nos deliciava e facilmente a todos conquistava, mas se nessa altura Keith Jarrett era já uma notável individualidade musical de alto expoente e gabarito e como instrumentista  já era muito, muito grande,  agora, muitos anos passados, é sem dúvida verdadeiramente… gigante!!!

Com efeito, hoje em dia já não há adjectivos que cheguem para podermos exprimir e catalogar todo o seu virtuosismo, todo o esplendor da sua musica impar e acima de tudo toda a sua genial  arte de improvisação, e também a intemporalidade das suas propostas e a amplitude da sua intimidade sonora e instrumental…

No seu novo duplo disco- “Budapest concert”, registado ao vivo no conhecido Bela Bartok Concert Hall, de Budapest, Hungria a 3 de Julho de 2016 , pouco tempo depois dum concerto em Munique, já não sei sinceramente que mais admirar:- se a sua soberba capacidade de mago executante, se o portento da sua arte ou a sua capacidade suprema de ir cada vez mais além numa incessante procura do belo, do perfeito, do inatingível e do sofisticado, numa viagem musical  absolutamente  memorável e inesquecível por composições de parte da sua esplendorosa obra já editada e que aqui, ao vivo, ganha realmente uma nova amplitude, impacto e…vida!!!

Para alem de tudo, este é “apenas” o segundo show completo a ser editado  da sua digressão de há cinco anos  que  constituiu, por assim dizer, uma espécie de “regresso a casa” do excelso pianista, que, pelo que sabe, tem ligações e raízes familiares antigas na Hungria; face à alta qualidade da actuação de Keith Jarrett pode dizer-se que a criatividade e a genialidade andaram de mãos dadas e positivamente à solta em Budapeste naquela belíssima noite húngara de 2016 e por tudo aquilo que se pode ouvir no duplo disco, que pena eu tenho de não ter podido estar lá presente para assistir a uma noite musical mágica, plena de virtuosismo, deslumbrante, inesquecível e, porque não dizê-lo,  verdadeiramente… imperial!

E pena porquê? Porque tocou lá, Sua Alteza Real D. Keith Jarrett  e eu estive “ausente”desse grande banquete musical!

2CDs ECM Records/Distrijazz

 

JOSÉ CID – da Chamusca para o Mundo

Inovador e revolucionário, no bom sentido entenda-se, pese embora o facto de algumas composições de sua autoria terem aquando da sua primeira aparição sido censuradas e mesmo até proibidas pela censura portuguesa

(a tristemente celebre e malfadada secção do lápis azul) e até ter cantado  Lorca, a quem dedicou um disco intitulado “Oda a Federico Garcia Lorca”, Pablo Neruda e a galega Rosalia de Castro, entre outros, desde sempre, quer a solo, no seio dos Babyes, dos Claves, no Orfeão Académico, no Quarteto 1111 ou nos Green Windows, José Cid muito cedo marcou o seu percurso musical e poético por uma identidade própria e um sentido estético e musical diferente de toda a gente, ao mesmo tempo que sempre assumia uma grande independência de modas e ditames, marcando bem as suas ideias e traçando com segurança o seu próprio percurso artístico mercê de uma maneira de ser muito pessoal e característica, nunca se negando no entanto a assumir sempre os seus actos e decisões e, acima de tudo, nunca deixando de dar os seus recados, quando ou a quem quer que fosse preciso dá-los quando era necessário, mesmo que isso, como costuma dizer-se, fosse “politicamente incorrecto”;  por outro lado, e até talvez por isso mesmo, essa sua grande independência e maneira de ser e estar na vida e na música, quase sempre lhe granjearam invejas e uma grandessíssima dor de corno  motivando ao mesmo tempo longos e por vezes duradouros ciúmes artísticos especialmente por parte de outros personagens, muitos deles de muito discutível dimensão estética, a maioria das vezes sem qualquer razão de ser e geralmente reveladores de uma grande menoridade mental, intelectual e especialmente…musical!

No entanto, pese embora divergentes opiniões e por muito que isso custe a muitos dos seus detractores e doa a quem doer, a verdade é que na realidade José Cid  é o maior e mais bem sucedido compositor pop/rock português vivo mercê não só da grande quantidade de discos que já publicou, em editoras ou em pessoais edições de autor, mas também, sobretudo, por isso representar um quase infindável numero de canções de êxito, significativas de um extraordinário  sucesso granjeado não só junto do publico em geral, mas acima de tudo porque essencialmente isso teve a ver com os muitos lugares cimeiros nas mais diversas tabelas de vendas, classificações que por isso mesmo também lhe proporcionaram uma grande multiplicidade de galardões de prata, ouro, platina e até multi-platina, prémios perfeitamente justificáveis, e convenhamos, mais que merecidos, de uma brilhante e bem sucedida carreira musical como interprete solista , autor e cantautor, num percurso artístico e musical que afinal de contas sempre se tem pautado por uma grande criatividade e brilhantismo…

Quem não recorda a quase infindável lista de enormes sucessos populares tais como “A Anita não é bonita”, “A minha musica”, “Na cabana junto à praia”, “No dia em que o rei fez anos”, “Um grande, grande amor”, “Como o macaco gosta de banana”, “Portuguesa bonita”, “Junto à lareira”, “Verdes trigais em flor”, “A rosa que te dei”, “Lenda de El Rei D. Sebastião”, “O meu piano”,“20 anos”, “Ontem, hoje e amanhã”, “Quadras populares”, “Rumo ao Sul” ou ““Para lá do Marão” e muitos, muitos mais?

Isto para não falar já do extraordinário, para a altura, concept álbum “10.000 anos depois entre Vénus e Marte”, que angariou enorme êxito não só intra como extra-muros , um projecto que a celebre revista americana Billboard considerou inicialmente num honroso  56º lugar numa listagem dos 100 melhores discos mundiais…

Curiosamente, ou até talvez não, não posso deixar de aqui recordar-me de algumas conversas que com ele tive na sua antiga e acolhedora casa de Alcochete ou no seu belíssimo Palácio de Pinteus, ali prós lados de Loures ou até mesmo em diversos repastos e etílicas noitadas que partilhei com o meu querido e muito saudoso amigo – o fadista monárquico João Ferreira Rosa (1937-2017), laureado interprete de grandes êxitos musicais do nosso fado nomeadamente do belíssimo e consagrado “Fado do embuçado”, que já  desapareceu infelizmente do nosso convívio, quando este por várias vezes me confidenciou que na sua opinião pessoal o real estatuto como artista e compositor de José Cid era bem maior do que o País em que ele vivia…

Infelizmente é  bem verdade, como por vezes diz o povo na sua enorme e infinita sabedoria, que geralmente “ninguém é profeta na sua terra!” e isso aplica-se perfeitamente ao Zé Cid, um artista que bem merecia triunfar, com carácter de mais assiduidade, em maiores e diferentes horizontes musicais e em mercados mais sonantes, significativos, comercialmente mais agressivos e valiosos e por isso mesmo até muito mais monetariamente  generosos que não o deste pequeno País à beira-mar (im)plantado, onde por vezes a mesquinhez, o ciúme doentio e a vaidade pessoal se sobrepõem ao valor da própria pessoa e ao reconhecimento geral!

Camaleónico, versátil e inspirado compositor que tanto se sente à vontade no campo do rock, da pop, do rock progressivo, da balada, das canções de amor, da música popular e tradicional portuguesa ou até mesmo no meio fadista, José Cid tem sido assiduamente notícia não só por  causa das suas controversas, mas sempre sonantes, sumarentas e apetitosas entrevistas, outras vezes pelas edições de novos discos em nome próprio e finalmente pelo facto de a editora que fundou,  financia e dirige- a ACid records– e que tem tido como objectivo prioritário divulgar e dar a conhecer ao grande publico e aos media em geral, alguns novos valores que por cá vão surgindo, continuar a publicar trabalhos dele e de outros artistas; entre estes  destaco um do meu querido amigo, e também doente do Benfica, há tempos infelizmente desaparecido do nosso convívio e também do numero dos vivos – o ribatejano António Pelarigo (1953-2018), que com um trabalho de título homónimo, assinou um dos mais belos discos de fado dos últimos anos, trabalho esse que fez as delícias de um meu também querido amigo e vizinho de cativo na  catedral da Luz- o matador de toiros Mário Coelho, infelizmente também recentemente desaparecido do número dos vivos, vitimado pelo maldito coronavirus, maleita que assentou arraiais por cá e não se sabe, pelo menos para já, quando vai de abalada; por mim pode mesmo retroceder e ficar-se por terras longínquas na enigmática China, de onde, pelo que se vai sabendo, ele é… laboratorialmente  natural!

Nos últimos tempos, antes como é óbvio do aparecimento da maldita pandemia que desde Fevereiro deste ano vai assolando a Humanidade, o “cavaleiro” de Mogofores não esteve parado e assim pouco tempo depois de ter sido agraciado com um Grammy latino  de excelência musical,  propôs o ano passado aos seus admiradores e ao público em geral duas novas propostas discográficas:- primeiro um novo trabalho de grande fôlego – “Clube dos corações solitários do capitão Cid” e  mais recentemente um outro projecto em disco também-”Fados, fandangos, malhões…e uma valsinha”, dois belos e inspirados trabalhos que vieram enriquecer mais ainda o já valioso espolio discográfico do artista, um homem que originário da Chamusca, ali no lindo Ribatejo, assentou arraiais com a idade de 11 anos na  Mealhada, mais concretamente em Mogofores,  em pleno coração da terra do legítimo leitão assado à moda da Bairrada, uma inigualável iguaria dos deuses que infelizmente, tal como sucede com muitas outras, é muito copiada, mas também bastante vilipendiada, pois muita gente vai tentando em restaurantes, alguns bem caros por sinal, imitar e impingir aos menos preparados de olfacto, gosto e paladar algumas “cópias”, que no entanto não passam de pobres sucedâneos  do celebre prato bairradino, levando por isso, e conscientemente, ao engano os mais incautos que assim são levados a comer gato por lebre!!!

Como diria o meu querido  Alfredo Saramago, gourmet, escritor de livros de comezainas e seus derivados, apreciador e grande conhecedor de puros havanos (charutos) e outros prazeres mundanos e fundador da extinta revista Epicur, de boa memória:- “…tudo que é regionalmente português e tem local de nascimento definido e confirmado, deve ser comido ou bebido no local próprio, isto é em “su sítio”…

Mas voltando aos dois novos discos, o primeiro deles foi feito em jeito de homenagem à obra mítica -“Sergeant Peppers…” do mais famoso quarteto de Liverpool- os Beatles , cuja capa original inspirou este trabalho de Cid e onde, a par das caras que lá figuram, cada um pode acrescentar, num espaço próprio e nela pré-delineado, o seu próprio rosto conseguindo assim muito facilmente personalizar o disco, que pode considerar-se como uma espécie de flashback nacional e internacional das ultimas décadas onde são abordados vários temas, alguns deles mesmo verdadeiras maldições actuais e a precisar de urgente resolução, que só poderá ser a sua extinção, tais como a sempre discutível e problemática central nuclear de Almaraz ou a  mina de urânio de Salamanca, ambas em Espanha, infelizmente portanto a curta distância da fronteira entre os dois países ibéricos; também no disco se abordam  várias figuras nacionais e mundiais de relevância, algumas delas tão distintas entre si como eram por exemplo Natália Correia e Marilyn Monroe; masterizado no celebre estúdio onde gravavam os próprios Beatles – Abbey Road, é um trabalho acústico e de certo modo simples comparativamente com os últimos trabalhos do artista, mas ao mesmo tempo de uma  grande envergadura quer o avaliemos do prisma da composição ou da concepção poética e instrumental, sendo porém mais outro flagrante exemplo da grande criatividade e imaginação de um músico impar que à música portuguesa tem dedicado toda a sua inspiração, amor  e capacidade inventiva.

O segundo disco, que aborda e aprofunda fundamentalmente a temática da música popular portuguesa, é um verdadeiro compendio de melodias,  sons e ritmos que geralmente ornamentam a  nossa  MPP e que quanto a mim apesar de se pautar por uma evidente qualidade, tem um momento de grande magia e inspiração e constituiu por isso mesmo uma canção  inesquecível  e quase épica  quando  a cantar em dueto com José Cid o nosso nome maior do fado no masculino – Ricardo Ribeiro, revela-nos o melhor de si mesmo, dando vida de forma absolutamente brilhante, e como só mesmo ele seria capaz, à composição”Por calles y vielas”, onde atinge um impar e inusitado brilhantismo interpretativo ao mesmo tempo que o sentimento com que canta sobe a altos níveis de exigência vocal e se transforma  numa exemplar, soberba e  impressionante demonstração de como se consegue fazer de uma  canção simples um momento vocal antológico!

O projecto encerra com outra belíssima composição, que ao mesmo tempo constitui uma verdadeira e directa declaração de amor quando o seu autor dedica a sua mulher- a pintora timorense Gabriela Carrascalão  a belíssima composição “No tempo feliz”, também outro dos momentos altos do disco!

Agora, com dois grandes projectos debaixo do braço o que faltará então  para que eles se tornem ainda maiores, mais dimensionados e consigam um maior sucesso popular?

É fácil:- basta que os media nacionais ( especialmente os nacionalizados, nossos, e pagos com o suado dinheiro dos contribuintes em especial a RTP) , geralmente muito mais interessados em divulgar produtos menores, mas que eles por vezes elevam a hits de pacotilha  porque vieram do estrangeiro constituindo essa via para eles um (errado) sinónimo de garantia e qualidade, dêem a estes grandes dois discos portugueses o devido tratamento, afinal o tratamento que eles efectivamente merecem, dando-os a ouvir, divulgando-os, promovendo-os, consoante for caso através da rádio ou da tele difusão dos seus conteúdos, preenchendo as suas enfadonhas malfadadas e muitas vezes mal frequentadas playlists , isto quando enaltecem as músicas em língua estrangeira, com as canções dos dois projectos do cantautor português e assim, deste modo, não fugindo com o rabo à seringa, estarão a cumprir eficazmente a missão que lhes foi confiada, por lei no Diário da República, de divulgação obrigatória da música portuguesa de qualidade, como indubitavelmente é toda esta que integra os dois discos do cantautor português, que quase apetece dizer, apesar de ser uma frase já muito estafada, que ele (Jose Cid) é como o vinho fino ou generoso do Douro especialmente quando se trata de um vintage:- “quanto mais velho, melhor”!

CD-DVD e CD ACid records (apoios SPA e Antena 1)

 

SERGIO GODINHO – revisitação ao vivo

Mais um grande projecto da área da música portuguesa vê a luz do dia em pleno período de governamental confinamento e vem sobremaneira enriquecer, em matéria de ofertas discográficas, este Natal de 2020, no qual estou certo, apesar de todos os  condicionalismos e dos cada vez menores recursos financeiros a nível  familiar, os objectos com conteúdos musicais nomeadamente CDs, DVDs e Blurays vão ser, a par dos inevitáveis jogos, as ofertas mais desejadas e ao mesmo tempo as prendas mais acessíveis, monetariamente falando…

Resultante dos concertos que o nativo tripeiro Sérgio Godinho deu em Julho de 2018 no São Luiz de Lisboa, shows que resultaram num sucesso absoluto, o cantor de texto da Foz do Douro fez-se aí acompanhar pela primeira vez por uma orquestra – a OML dirigida pelo maestro Cesário Costa e com Filipe Raposo nas teclas e responsável pelos arranjos para orquestra, para além dos seus músicos habituais (Os acessores dirigidos por Nuno Rafael) iniciando assim deste modo as celebrações de meio século de uma carreira marcante na história da música de texto nacional, espectáculos onde incluiu também pela primeira vez temas do disco “Nação valente” editado nesse mesmo ano ao mesmo tempo que revisitava alguns dos mais emblemáticos  sucessos do seu percurso musical tais como “O primeiro dia”, “Bomba-relógio”, “Com um brilhozinho nos olhos”, “A noite passada” ou “O velho samurai” que aqui volta a ganhar vida e um novo brilho.

Instrumental e vocalmente brilhante “Ao vivo no São Luiz” é sem dúvida uma grande mais valia para as listas de prendas musicais deste Natal tanto mais que nos apresenta Sérgio Godinho no melhor da sua forma, cantando melhor que nunca e interpretando como só ele sabe várias canções do nosso imaginário musical português    …

CD Universal Music

 

A DANÇA DOS PAULITEIROS – um tesouro a preservar

Infelizmente neste país à beira-mar (im)plantado, frequentemente sucede

dar-se pouco ou nenhum valor às nossas coisas, aquelas que são caracteristicamente  nossas, bem tradicionais e acima de tudo bem genuinamente portuguesas e quantas das vezes também de grande valor patrimonial e histórico, enquanto sempre se vai sobrevalorizando quase sempre tudo o que vem de fora, normalmente de discutível qualidade e pouco ou mesmo nulo interesse histórico ou cultural!

Entre as manifestações tradicionais que entre nós andaram durante muitos anos praticamente sem relevo e como que ignoradas pelos media e por quem tem obrigações de as promover e divulgar, quanto mais não seja dentro  de portas, estão as danças dos celebres Pauliteiros de Miranda, sua genuína singularidade, raízes históricas e culturais e acima de tudo a sua ancestral identidade transmitida através dos séculos.

A dança dos Pauliteiros constitui uma das expressões etnomusicais mais identificadoras da terra e das gentes de Miranda do Douro, sendo por isso mesmo unanimemente considerada como uma das mais significativas manifestações da sua identidade cultural tendo adquirido características muito próprias, quer do ponto de vista coreográfico, quer do ponto de vista musical ou ainda no que se refere aos respectivos trajes e contextos performativos tradicionais.

Com origens que permanecem objecto de investigação entre os seus estudiosos – num processo de reflexão que, em Portugal, se iniciou apenas no ultimo quartel do século XIX, o que atesta bem do desconhecimento a que o país cronicamente votou toda a extensa área do nordeste transmontano- estudiosos que movendo-se em distintos domínios do conhecimento- desde a antropologia à etnomusicologia, da etnografia à  etnocoreologia- convergem no entanto no reconhecimento da respectiva antiguidade, a dança dos Paulitos ou dança dos pauliteiros, como depois se tornou mais  conhecida, não só identifica a terra de Miranda( dentro e fora do território actual) como transmite uma vigorosa expressão da sua identidade cultural.

O presente trabalho, “A dança dos pauliteiros – memoria e identidade da terra de Miranda”, levado a cabo pelo atrás referido Mário Correia apresenta-se como um contributo integrador das narrativas que foram sendo produzidas, num processo de verdadeira  arqueologia etnográfica, cuja dispersão e desconstextualização temporal se procura desta maneira contrariar , sendo a recolha por ele efectuada, de sobremaneira evidente no que se refere aos textos dos laços, constituindo um acervo documental de inegável relevância

Uma obra absolutamente notável, que constitui por isso mesmo também um contributo importantíssimo e absolutamente fundamental para uma melhor compreensão deste verdadeiro fenómeno de massas nordestino, que vem assim documentar um bem patrimonial imaterial da cultura tradicional mirandesa e constitui um verdadeiro tesouro cuja salvaguarda e valorização é afinal de contas tarefa de todos os portugueses, e especialmente de todos transmontanos mirandeses.

Assim, ao longo de 322 páginas desta  belíssima obra, profusamente ilustrada com fotos e outras imagens, está todo o historial dos Pauliteiros e suas mais diversas nuances, escrito por um investigador conceituado e de grande prestigio que ao fenómeno tem dedicado grande parte da sua vida bem como, paralelamente, ao estudo de muitas das Musicas do Mundo, pesquisando-as, escrevendo sobre elas, promovendo e divulgando-as e acima de tudo trazendo, sob a forma de festivais, muitas delas para junto do grande publico e especialmente dos melómanos…

Livro Sons da Terra  (apoio da Câmara Municipal de Miranda do Douro)

 

ANJA LECHNER/F. COUTURIER – belos climas sonoros

A continua ampliação de horizontes musicais, sem deixar no entanto de interiorizar diversas influencias e reportórios, para assim mais facilmente desenvolver propostas próprias, é quase sempre o objectivo principal da instrumentista alemã Anja Lechner, mais evidente no seu mais recente projecto com o pianista francês François Couturier, intitulado genericamente “Lontano” ,.em que assinam a solo ou em duo a maioria esmagadora das composições  que integram o disco – onze numa totalidade de dezasseis- e em que dão mostras de toda a sua excelsa arte de compositores e interpretes demonstrando assim porque são considerados exímios músicos e instrumentistas de elevado estatuto.

Excelentes improvisadores, tanto interpretam composições originais de sua autoria ou de outrem, como improvisam a seu bel-pazer diversos reportórios desde  uma cantata de Bach a uma canção folclórica argentina e por isso mesmo são de uma versatilidade a toda a prova; no novo projecto propõe-nos uma série de deslumbrantes climas atmosféricos sonoros sob a cama de texturas subtis  e envolventes concebendo uma obra de rara beleza e sensibilidade que por isso mesmo merece uma cuidada e demorada audição!

CD ECM/Distrijazz

 

ANA MOURA – discografia integral

Considerada uma das melhores e mais excitantes vozes fadistas da sua geração, Ana Moura propõe aos amantes do fado e aos melómanos em geral uma prenda natalícia de grande qualidade e total agrado:- nada mais, nada menos que um caixa contendo toda a sua discografia constituída por seis discos, onde por isso mesmo vamos poder encontrar alguns dos seus mais brilhantes e bem sucedidos temas tais como, entre muitos mais, “Os búzios”, “Fado da procura”, “Guarda-me a vida na mão”, “ Bailinho à portuguesa”, “Quem vai ao fado”, “Desfado”, “Dia de folga”, “Não hesitava um segundo”, “Fado das águas” ou ainda “Vaga no azul amplo solta” (composição feita de propósito para o disco “Para além da saudade” pelo saudoso cantautor espanhol Patxi Andion, que musicou um belíssimo poema da autoria de Fernando Pessoa e faleceu num desastre de viação em Espanha e sobre o qual se cumpre agora um ano em 18 Dezembro).

Fado com F grande em toda a sua dimensão e brilhantismo na voz sedutora de uma grande fadista – Ana Moura!

Caixa de 6CDs  Universal Music

 

DINO SALUZZI – a magia do bandoneon

Todo o ambiente, dramatismo e originalidade de um instrumento mágico dotado de uma sonoridade única -o bandoneon, aqui tocado por um dos seus mais lídimos executantes – Dino Saluzzi , que ao longo das nove composições do disco –“Albores”, o seu primeiro trabalho em solitário desde há mais de 30 anos, nos propõe uma espécie de viagem interior criando para isso paisagens sonoras que resplandecem como uma nova luz da alvorada, num encontro singular do executante a sós com o seu instrumento, que tem sido o seu companheiro inseparável desde a infância.

O disco é um verdadeiro manifesto artístico do bandoneon, onde se exploram todos os seus registos e imensas possibilidades cruzando matizes sonoros únicos e de uma grande beleza, que nos lembram imagens de Buenos Aires nos seus anos dourados e ficções de Jorge Luís Borges, bem como raros movimentos de astros, natureza e energias  todos reunidos num só, na busca de uma imensidade cósmica que mais que lembrar o passado, antes projecta o futuro em busca de uma plena liberdade, onde certamente se respirará cada vez mais e melhor em igualdade de sentimentos, paz e  amor num caminho que se antevê livre de escolhos e limitações.

Um projecto deslumbrante, de uma sonoridade única e intemporal que projecta o seu autor cada vez mais alto e mais além, através dum sentido estético exemplar onde se cruzam por vezes evocação, misticismo, oração, profundidade e devoção!

CD ECM/ Distrijazz

 

THOMAS DUNFORD/JEAN RONDEAU – a paixão do barroco

Projecto que reúne belas composições de autorias tão diversas como são François Couperin, Robert de Visée, Marin Marais, Michel Lambert, Marc-Antoine Charpentier e outros compositores mais , “Barricades”, traz até nós algum do barroco francês através de dois grandes jovens executantes franceses, de estilos bem contrastantes – Thomas Dunford e Jean Rondeau, que co-assinam o projecto, tendo estes chamado para colaborar na sua concretização a mezzo-soprano Lea Desandre, o barítono Marc Mauillon e a executante de viola da gamba Myriam Rignol; juntos, num excelente mas ao mesmo tempo difícil trabalho de grande envergadura melódica e sonora, alcançam o seu objectivo primordial:- conseguir chamar a si e apaixonar os amantes do barroc francês com um disco extraordinariamente coeso, bem estruturado e acima de tudo muito bem executado, a que as duas belas vozes dão um ênfase especial  através de um grande e natural brilhantismo vocal!

CD Erato/Warner classics/Warner Music

 

TERJE RYPDAL – arte electrónica

Longe vai já o ano em que no anfiteatro dos jardins da Fundação Calouste Gulbenkian  assisti a um dos habituais “Jazz em Agosto” e fiquei como que  siderado com a arte e mestria de um instrumentista norueguês genial que na altura começava a andar nas bocas do mundo- Terje Rypdal ; daí para cá fui tomando contacto com algumas das várias obras que sistematicamente foram sendo editadas, sempre entusiasmantes e inovadoras, diga-se em abono da verdade.

Agora acaba de me chegar às mãos o seu projecto discográfico  mais recente –“Conspiracy”, um disco que vindo na linha de outras obras precedentes do guitarrista nórdico corresponde no entanto a uma crescente mudança do guitarrista na busca de novas directrizes sonoras e marca o seu reencontro com a inspiração quase selvagem dos seus primeiros trabalhos; explorando todo o imenso potencial da sua guitarra eléctrica e tendo a seu lado possivelmente o melhor naipe de acompanhantes de que dispôs até hoje,  o musico de Oslo deslumbra através duma série de inspiradas composições em que sua imensa criatividade vêm ao de cima e propõe-nos seis composições brilhantes, algumas de sonoridade quase espacial, assinando deste modo um dos melhores discos da sua carreira acompanhado de três instrumentistas de eleição que de certo modo ajudam assim a projectar ainda mais o vanguardismo eléctrico das suas propostas.

CD ECM/Distrijazz

 

RESISTÊNCIA – festança no Atlântico

De memórias também se vive, comemora e recorda e por isso mesmo é sempre motivo de grandes festejos quando um supergrupo regressa aos palcos para actuar de novo e muito mais quando esse momento tem também muito a ver com uma efeméride, que neste caso é um quarto de século de existência e em prol da musica portuguesa, a encantar e a fazer vibrar milhares de admiradores do grupo; foi o que sucedeu com os Resistência, há três anos atrás, quando no antigo Pavilhão Atlântico (hoje Meo arena) se voltaram a encontrar para actuar, convidando para essa celebração dois nomes sonantes do panorama musical português, neste caso específico dois nomes gigantes da área do fado, como são sem dúvida António Zambujo e Raquel Tavares, amigos da banda desde sempre, que cada um à sua maneira fez questão de dizer “presente” e colaborar de modo pessoal e sobremaneira à grande festança que teve lugar no célebre recinto de espectáculos lisboeta e ao mesmo tempo a ajudar a dar outra vida, um outro sabor  e um novo brilho ainda, a seis das grandes e imorredouras composições da banda.

Assim, os dois fadistas juntaram-se a um ensemble brutal constituído por Alexandre Frazão(bateria), Fernando Cunha (guitarra de 12 cordas e voz), Fernando Júdice (baixo eléctrico), José Salgueiro (percussões), Mário Delgado (guitarras), Miguel Angelo (voz), Olavo Bilac (voz), Pedro Jóia (guitarra clássica) e Tim (voz e guitarra de 12 cordas) e em conjunto não só brindaram os presentes com um recital inesquecível, que tão cedo não esquecerão certamente, como também a reafirmar a identidade e a grande qualidade da musica  “made in Portugal”, feita por portugueses e, acima de tudo, cantada na belíssima língua de Luís de Camões e Fernando Pessoa.

Quem é que não gosta de por momentos voltar um pouco atrás no tempo e recordar inolvidáveis composições que constituíram autênticos mega sucessos como são, entre outras, “Nasce selvagem”, “Timor”, “Circo de feras”, “Se te amo”, “Fado”, “Não sou o único”, “Um lugar ao sol”, “Sete naves” ou “Chamaram-me cigano” e ” Que o amor não me engana”, ambas  da autoria do saudoso Zeca Afonso, que certamente ficaria imensamente orgulhoso e envaidecido se pudesse escutar as magistrais interpretações destas suas duas cantigas neste concerto ao vivo?

Pois são estas mesmas composições que, juntamente com outras dezassete canções, integram o extenso leque de temas ao vivo no memorável projecto “Resistência ao vivo no Atlântico-25 anos” onde é recriado este grande e memorável espectáculo comemorativo de 25 anos de vida de um conjunto de notáveis artistas, que, ou muito me engano, vamos poder ver daqui a uns poucos anitos a repetir este sucesso…

Um duplo disco inquestionavelmente soberbo, onde estão reunidas algumas das mais belas e inspiradas canções, algumas delas já verdadeiros hinos da história da música pop/rock portuguesa, que por isso mesmo merecem uma revisitação em disco urgente não só por parte dos fans mais fieis, mas  também, e especialmente, por parte daqueles que apreciam música portuguesa de qualidade; da boa!!!

2CDs Resistência/Sony Music

 

MARIA JOÃO/MÁRIO LAGINHA – gratas recordações

Durante muitos anos fizeram uma carreira a duo que se prolongou por  vários anos, imensas digressões intra  e extra-muros e consequentes projectos em disco; agora que a dupla terminou o seu percurso e cada um está, individualmente, na crista da onda de novo pelos projectos em que cada um deles se encontra mergulhado, acaba de surgir a sempre inevitável compilações de êxitos –“Maria João & Mário Laginha – best of que reune um conjunto de 14 composições em que é evidente o multiculturalismo e cumplicidade musical da dupla bem como a grande qualidade de que sempre deram mostra tanto a nível vocal (Maria João), como instrumental e sonoro (Mário Laginha e o seu piano).

Um disco que mais que recordar uma dupla jazzística portuguesa de grande sucesso, nos permite retomar o contacto e o imenso prazer de escutar bom jazz em português e poder de novo, matar saudades também de duas belas colaborações em que a dupla tem a companhia de dois grandes cantautores  brasileiros -Gilberto Gil e Lenine, que, cada um de seu modo peculiar, dão de facto uma outra dimensão e até mesmo um outro colorido e uma diferente amplitude vocal aos  dois temas que interpretam com a famosa dupla -“Um amor” e “Flor”

CD Universal Music

 

NOW 35 – sucessos a rodos

Projecto já com um longo historial e de indesmentível enorme sucesso junto do público português mais jovem e que é uma compilação similar às que lá fora se editam anualmente também, vai já no volume 35 e neste último, onde continua a vigorar a cumplicidade editorial entre a Universal e a Sony Music, que acaba de ser editado entre nós, vamos poder encontrar entre  a totalidade de 40 composições que o integram, as ultimas coqueluches musicais de vários países e de diferentes  tendências com destaque para os sucessos ingleses dançantes e para canções nacionais.

Assim desde êxitos dos The Weekend até John Legend, passando por Shawn Mendes, Lewis Capaldi, Sam Smith ou  Justin Bieber e pelos portugueses João Pedro Pais, Os quatro e meia, D.A.M.A., Ana Bacalhau, Diogo Piçarra com Carolina Deslandes, Carlão ou Nelson Freitas, um pouco de tudo e de todos os géneros musicais se pode encontrar neste “NOW 35”, uma dupla colectânea de grandes sucessos dos tops que tem tudo para dar certo e ser mais um sucesso de vendas especialmente durante a quadra natalícia que já bate à porta!

2CD Universal Music /Sony Music

 

SARA CORREIA

Longe vão os tempos em que a ouvi algumas vezes cantar (e encantar) em noites alfacinhas na celebre Casa de Linhares- Bacalhau de Molho e  até mesmo de quando no ano transacto foi editado o primeiro projecto a solo da fadista Sara Correia, em que  escrevi aqui no blog um texto elogioso sobre esse mesmo disco em que afirmei que tinha vislumbrado o futuro do fado no feminino e ele tinha o nome dela assinalado!

Agora, algum tempo passado e face à audição dum segundo trabalho, mais convictamente reafirmo essa minha pessoal posição de que estamos perante uma voz que vai certamente fazer parte no futuro da história da nossa canção nacional por excelência, pois as suas magnificas características vocais e a rara qualidade do seu timbre são mesmo  como o algodão:- não enganam!

Estamos por isso em presença duma verdadeira força da natureza, que possui  predicados vocais acima da média e que assim que solta no ar a sua voz arrepia de imediato quem a ouve ao mesmo tempo que deslumbra e arrebata…

Basta ouvir ao acaso uma qualquer composição, das muitas que fazem parte do reportório dos seus dois discos para se confirmar que nasceu para cantar e acima de tudo para… triunfar tal a intensidade com que canta, a enorme profundidade com que dá vida às palavras e a paixão que põe em cada interpretação, como se cada uma delas fosse a ultima!

Neste novo trabalho a fadista arrisca até, embora sem se afastar das raízes,  entrar por novos caminhos e áreas ao mesmo tempo que concede abertura em termos de autorias a uma série de colaborações com  gente de certo prestigio  tais como Diogo Clemente( que para alem de tudo produziu com certo brilhantismo este novo disco), Paulo Abreu Lima, Joana Espadinha, Mário Pacheco, António Zambujo( que assina com ela um belíssimo dueto), Luísa Sobral, Jorge Cruz ou Vitorino entre outros, que cada um à sua maneira ajudam a subir bem alto a qualidade e cotação do binómio  disco/artista, adicionando-lhe novos elementos e matéria prima, que de certo modo evidenciam, embelezam e valorizam o conteúdo do disco, apesar de alguns até virem de áreas, concepções musicais e diferentes sonoridades, ligeiramente distantes do fado propriamente dito…

Um disco de um brilhantismo vocal imaculado, que vem projectar em definitivo esta nova voz feminina para os píncaros ao mesmo tempo que lhe assegura um radioso futuro, tal o fogo com que incendeia a fogueira fadista que arde dentro dela e a faz transcender-se e potenciar-se um pouco para lá dos limites da genialidade vocal!

CD Universal Music

 

CHARLIE PARKER – um centenário em celebração

No ano em que se comemora o centenário do seu nascimento Charlie Parker (1920-2020), sem duvida, e na área do jazz, o melhor saxofonista-alto de todos os tempos, é notícia por variadíssimas razões nomeadamente pela edição de uma série de livros e de trabalhos originais seus em CD e em vinil, alguns surgindo pela primeira vez editados no mercado, outros sendo objecto de novas compilações ou algumas novas  reedições onde parte do seu fantástico espólio de centenas de gravações de estúdio e ao vivo é posto a nu e disponível, possibilitando-se assim que para alem dos seus incondicionais admiradores outros sectores tenham oportunidade de tomar contacto com a magistral obra de um dos maiores génios da grande música negra que influenciou, e ainda hoje em dia influencia, uma plêiade de novos instrumentistas que aos instrumentos (saxofone e saxofone-alto) dedicam toda a sua atenção e entusiasmo; para alem de vários trabalhos a solo  surgiram também alguns outros onde o insigne e imortal saxofonista  surge em diversas colaborações com outros instrumentistas de gabarito e renome assumindo no entanto ele a liderança dos projectos e sendo portanto esses trabalhos considerados como parte indissociável da sua valiosa discografia.

Entre eles podemos salientar por exemplo as recentes, brilhantes e muito atractivas edições da Distrijazz :- “Charlie Parker & Lenny Tristano” onde o insigne instrumentista surge a tocar com um dos mais fabulosos pianistas que ele sempre admirou; “Bird and Diz”, com Charlie a emparceirar com o mítico Dizzy Gillespie; “Complete Bird in Sweeden”, uma das mais fantásticas e memoráveis actuações de uma extensa digressão europeia dos finais de 1950; ”Now´s the time”, onde o seu naipe de acompanhantes surge sob a forma de dois diferentes quartetos, sendo uma das formações de 1950 e a outra do ano seguinte, as duas aqui reunidas num único disco; para alem destas aqui citadas merecem ainda destaque ”The complete Savoy masters”,  duplo CD com as gravações integrais que tiveram lugar na famosa sala de concertos; “Jazz at Massey Hall” preenchido com  registos ao vivo na celebre sala canadiana;  “The complete Dial masters” que como o próprio título deixa antever reúne as gravações efectuadas para aquela celebre etiqueta;  “Complete Bird at the Rockland Palace”, que integra o concerto ao vivo de Parker naquela sala nova-iorquina e ainda inclui vário material bónus; “At Café society” com espolio musical gravado neste celebre café e clube de jazz no ultimo ano da sua existência; “South of the border”, disco em que o saxofonista surge em formações designadas por small groups à frente de uma secção rítmica de jazz latino e finalmente “Plays Cole Porter”, brilhante disco de homenagem ao grande compositor…

Para alem deste projectos que aqui referi merece destaque também uma nova colectânea de sucessos designada genericamente “The hits”, um fantástico compendio do pai do bebop que reúne em três CDs nada menos de 70 composições e nos permite para alem de nos deliciarmos com a sua arte, tomarmos também contacto com a genialidade de alguns dos seus vários e numerosos comparsas  musicais onde é por demais evidente o gabarito e a alta craveira de altos instrumentistas, figuras verdadeiramente míticas como Dizzy Gillespie, Miles Davis,  Thelonious Monk, Charles Mingus, Max Roach ( que saudades das suas inesquecíveis master classes há anos atrás na Gulbenkian aquando de uma memorável visita para actuação no Grande auditório), Duke Jordan, Bud Powell, Hank Jones ou Buddy Rich.

Esta edição tem também a particularidade de incluir a sua clássica e mítica actuação ao vivo no Canadá datada de 1953 –“Massey Hall concert”, pela critica especializada da altura considerada como uma das mais geniais actuações do saxofonista alto que aqui surge rodeado por um soberbo quarteto de eleição que incluía  quatro verdadeiros “monstros sagrados” do jazz:- Bud Powell, Dizzy Gillespie, Charles Mingus e… Max Roach !!!

Nestas novas edições (algumas delas – as da Bird´s nest de edição limitada) há que salientar o facto de todas as gravações (da Savoy, Dial e Verve) terem sido objecto de cuidadas remasterizações digitais, isto apesar de alguns terem já para a época uma invulgar qualidade de gravação, beneficiando ainda todos os discos da adição de novos booklets contendo textos biográficos actualizados, bem como da inclusão de fotos inéditas, elementos que vem sobremaneira valorizar e enriquecer estes fabuloso projectos de um personagem único do mundo do jazz que se tornou, mercê da sua arte, virtuosismo, carisma e inusitadas capacidades instrumentais e inventivas  não só numa figura imortal mas também numa verdadeira lenda da grande música negra!

CDs New Continent e Birds Nest /Distrijazz

 

ERROL GARNER

Destacou-se no mundo da grande musica negra como um dos mais versáteis e conceituados instrumentistas de teclas de todos os tempos a que pouco a pouco adicionou uma série de outros predicados e elogios, acabando por ser unanimemente considerado pela critica em geral e pelo público melómano do jazz como um executante brilhante e virtuoso e um inspirado pianista e compositor, afinal de contas as elogiosas referencias que sempre foram pautando o seu trabalho posterior quer em discos, quer em concertos ao vivo; um dos seus mais populares e bem sucedidos discos vendeu mais de 225.000 cópias, soma absolutamente estratosférica para a altura,  durante o ano seguinte ao da sua edição original em 1956 e constituiu um dos seus mais excitantes projectos discográficos – “Concert by the sea” , que agora acaba de ser reeditado numa versão especial- digipack, contendo novas e mais completas notas biográficas, isto para alem da sua completa remasterização e da inclusão, como bónus, de nada menos de dez composições extra, que não figuravam na edição original e que elevam a duração do conteúdo do disco para perto dos oitenta minutos!

Para alem de ter sido o trabalho mais vendido do pianista e do mundo do jazz na altura, o projecto, que inicialmente nem sequer estava pensado para ser apresentado ao vivo e serviria apenas para preencher a programação de um concerto para a estação de rádio das forças armadas norte-americanas de então, para além de tudo, representa o auge da sua maturidade artística e da sua criatividade,  predicados que aqui estão bem patentes nesta gravação que teve lugar em Carmel, Califórnia a 19 de Setembro de 1955 e conseguiu transformar Erroll Garner numa verdadeira estrela  musical, com o estatuto quase de uma pop-star ; um projecto onde o pianista contou com  mais duas imprescindíveis e brilhantes presenças   instrumentais :- as de Eddie Calhoun, no baixo e Denzil Best, na bateria , qualquer um dos dois com prestações ao nível do pianista.

CD American Jazz Classics/Distrijazz

 

LUDOVICO EINAUDI

Do grande compositor e instrumentista contemporâneo Ludovico Einaudi , homem conotado especialmente com a música dita erudita, mas que tem nos últimos anos também espraiado as suas capacidades de compositor por outras áreas bem diferentes e distintas como o pop, o rock, as musicas do Mundo ou a folk  e feito carreira também como compositor de bandas sonoras de cinema como foi o caso das dos filmes “ Os intocáveis”, “Doutor Jivago” ou “Acquario” , entre outros, acaba de se publicar “Undiscovered” duplo disco que é assim a modos que uma colectânea de sucessos do  seu autor  pois explora o seu vasto catalogo de edições ao mesmo tempo que revela algumas preciosidades  menos conhecidas e que por isso mesmo vão acabar por ser o principal motivo de curiosidade dos seus admiradores que assim poderão desvendar verdadeiros “tesourinhos”, alguns deles ainda inéditos em matéria de edição; o duplo trabalho inclui ainda também quatro composições registadas ao vivo, uma em Berlim e três outras no célebre Teatro à la Scalla, de Milão.

Música de grande beleza estética que convida à meditação, relaxante e cativante, por vezes ligeiramente minimalista surge-nos através de dez diferentes composições envolta numa embalagem sonora contemporânea de certo brilhantismo a que algumas vocalizações femininas dão um invulgar colorido e que por isso mesmo seduz com facilidade e chega mesmo a deslumbrar!

2CD Decca/Universal Music

 

MAGIC MOZART

Tendo em vista a promoção e divulgação do evento deste ano do já célebre Festival Mozart Maximum idealizou-se localmente um projecto discográfico através dum pack muito especial, qual cabaret mágico inédito, que resultou numa sofisticada colectânea de programação bem popular  com  origem em obras como “A flauta mágica”, “La noche de Fígaro” ou “Don Giovanni”,

compilação para a qual se seleccionaram uma mão cheia de árias célebres de algumas das mais famosas óperas do homenageado compositor Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) , composições essas que evocam três diferentes formas de magia- a negra (que representa o diabo), a branca (o bem) e a vermelha (o amor) através de soberbas interpretações a cargo de algumas das mais conceituadas vozes da música erudita contemporânea de origem francesa , todos eles conceituados interpretes de Mozart tais como são as das sopranos Jodie Devos e Sandrine Piau, da mezzo-soprano Lea Desandre, dos tenores Loic Félix e Stanislas de Barbeyrac e do barítono Florian Sempey que, cada um à sua maneira, ajudaram assim a celebrar  com grande pompa, dignidade e talento um dos mais brilhantes compositores da música clássica mundial sobre uma cama musical soberba proporcionada pela Ínsula Orchestra sob a direcção do maestro Laurence Equilbey; um projecto arrebatador, notável e acima de tudo absolutamente intemporal a que especialmente os amantes de Mozart e também os melómanos da clássica vão dar uma especial atenção!

pack Erato/Parlophone/Warner Music classics

 

ANDRÉ CLUYTENS

Sob uma cama musical verdadeiramente majestosa a cargo da conhecida Berliner Philharmoniker Orchestra as nove sinfonias completas de Ludwig van Beethoven (1770-1827) ganham agora nova vida, muitos anos após terem sido registadas pela primeira vez em gravação e isto muito antes do famoso Herbert van Karajan as gravar também e editar com extraordinário sucesso; isso mesmo pode ser comprovado na audição do conteúdo de “Beethoven- 9 symphonies-overtures” , atractiva caixa de cinco discos recentemente lançada, onde a obra do consagrado compositor alemão é superiormente dirigida sob a direcção e condução de André Cluytens, (1905-1967) maestro oriundo do seio de uma família musical e que tendo nascido na Bélgica acabou no entanto por se radicar por volta de 1932 em França onde exerceu grande parte da sua actividade musical, isto embora esta estadia tenha sofrido um curto interregno  temporal quando nos Estados Unidos dirigiu uma muito celebre orquestra- a Filarmónica de Nova Iorque.

Esta reedição acaba por funcionar também assim a modos que uma espécie de homenagem à memória do famoso director de orquestra belga, numa altura em que já se completaram mais de cinquenta anos sobre o seu desaparecimento físico, um homem de extraordinário valor e reputação que era especialmente reconhecido  por deixar a música que dirigia brilhar e respirar por ela própria, nas sessões de gravação que dirigia e que acabaram por se transformar em históricas e clássicas gravações; eis aqui uma grande oportunidade para se oferecer uma fantástica prenda de Natal sobretudo para os milhares de admiradores de Beethoven e para melómanos da música erudita!

Caixa de 5CDs Erato/Warner classics/Warner Music

 

JOHN LEE HOOKER

Celebérrimo nome da cena da grande música negra da América, neste caso concreto, dos blues norte-americanos, John Lee Hooker (1917-2001) é  bastantes vezes notícia pelo facto de surgirem novas compilações com origem no seu extenso e valioso espólio musical e também pelo facto de muitas delas representarem por vezes reedições dos seus discos originais, algumas com a inclusão de muitos temas extra que geralmente não faziam parte dos alinhamentos iniciais; agora o motivo da noticia é a recente edição, numa série que compreende dois trabalhos originais num só disco, ( 2LPs on 1 CD) série essa que tem alcançado grande sucesso junto dos melómanos do jazz e dos blues, tanto mais que para além do facto de geralmente apresentar na sua totalidade um grande numero de canções, normalmente beneficia do facto de ser remasterizada, sair em edição limitada a poucos exemplares (neste caso apenas 500), incluir um novo libretto com fotos raras e notas biográficas actualizadas e ainda muitas dessas vezes se apresentar  mais valorizada ainda pelo facto de quase sempre  incluir várias canções absolutamente inéditas que surgem pela vez na actual versão CD.

É o caso de “On campus” e “The Great John Lee Hooker”, dois grandes álbuns, bem antigos por sinal, e também se calhar por causa disso menos conhecidos, agora editados em conjunto e num só volume portanto, com a inclusão de seis “novas” composições como extra e  que apesar de se apresentarem como duas das obras menos badaladas e popularizadas do famoso “king of the boogie”, que a revista Rolling Stone chegou a classificar num honroso 35º lugar na lista dos 100 melhores guitarristas do Mundo, trazem no entanto a inconfundível marca do som característico da sua guitarra, da sua voz e do indelével perfume sonoro com que só Hooker  sabia impregnar as suas inspiradas composições; a grande musica do delta americano na voz de uma da suas mais representativas figuras– o imortal John Lee Hooker!

CD Soul Jam/Distrijazz

 

JACKIE WILSON

Foi uma figura impar e um incrível performer , um interprete genial e em palco um entertainer verdadeiramente eléctrico, isto para alem de ter sido uma influência inspiradora para muita gente como os imortais Elvis Presley ou Michael Jackson , dupla que assiduamente o visitou quando atravessou um longo período de nove anos de hospitalização motivada pela doença que o confinou a uma cama de hospital após o ataque cardíaco que o acometeu quando actuava ao vivo e do qual nunca recuperou; por outro lado Jackie Wilson (1934-1984) foi uma das mais salientes personagens da era da soul music tendo mesmo sido ele o principal responsável pela tranquila transição do rhythm and blues para a mesma soul.

Dele, acaba de se publicar  na serie “2LPs on 1CD”,  numa edição limitada e remasterizada,  o projecto que abarca dois discos da sua discografia – “Body and soul” ( de 1961) e “You ain´t heard nothin´yet” (de 1962) onde podemos encontrar uma série de grandes exitos como “Body and  soul”, “Blue moon”, “I´ll be around”, “Califórnia here I come” ou “There´ll be no next time”, composições/sucesso que atravessaram décadas e o confirmaram como a mais completa figura vocal da sua geração que tinha Elvis Presley e James Brown como dois dos maiores expoentes vocais.

A edição traz ainda como extras quatro temas mais, perfazendo assim uma totalidade de 28 canções disponíveis neste  projecto verdadeiramente electrizante dum interprete genial  habitualmente conhecido nos media também por ”Elvis negro”!

CD Soul Jam /Distrijazz

 

BOSSA NOVA – 75 classic hits

Não sei se hei-de chamar-lhe bíblia ou simplesmente belo arquivo sonoro (embora se trate na realidade de uma fabulosa colecção de êxitos da bossa nova, que pode definir-se como um movimento de renovação do samba que ficou associado umbilicalmente ao crescimento urbano brasileiro, especialmente na cidade do Rio de Janeiro) a um projecto recentemente editado e que é constituído  por três  compact discs,  onde está contada sumariamente e através de nada menos de setenta e cinco canções grande parte da história do célebre ritmo carioca que nasceu na cidade do Cristo Redentor, tomou forma, ganhou pouco a pouco fama e mais tarde alcançou inusitada uma projecção mundial por alturas do final dos já longínquos anos 50 especialmente nos Estados Unidos para onde, o então designado de novo ritmo autenticamente “emigrou”, muitas vezes através do facto de as líricas em português terem beneficiado de  tradução para inglês, para pouco a pouco, canção a canção, tomar de assalto as tabelas de vendas, seduzir e encantar os mais exigentes críticos e público em geral e fazer suspirar muita gente admiradora ou não da habitual música popular brasileira de então; e de tal maneira se popularizou e quebrou barreiras que mesmo muito mais tarde, mais concretamente por alturas de meados de 1962, ainda se voltou de novo a ouvir falar dela, especialmente quando algumas das mais conhecidas vozes norte-americanas, algumas mesmo da especifica área do jazz,  entre as quais se podem destacar Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan, Frank Sinatra ou Stan Getz começaram a dar a conhecer nos seus concertos e nas gravações de estúdio, as suas próprias e individualizadas versões de algumas das mais populares composições  tais como “Desafinado”, “Aguas de Março”, “Chega de saudade”,  “Manhã de Carnaval”, ( fabulosa a versão de  Quincy Jones), “Desafinado” ( Dizzy Gillespie fez dela um dos mais altos momentos dos seus concertos na altura), “Samba de uma nota só” (é verdadeiramente fantástica e absorvente a versão da autoria do grande saxofonista de jazz Stan Getz), “Samba para Bean” ( Coleman Hawkins deu-lhe um vigor extraordinário e tornou-a um tremendo sucesso) ou “Outra vez”, composição de que Sérgio Mendes autenticamente se apoderou de tal maneira que com ela obteve durante anos um extraordinário sucesso pessoal conseguindo assim angariar para a sua musica e para o seu jazz personalizado uma plêiade de novos e fieis admiradores.

Pois todos estes mesmos sucessos fazem parte do projecto/compilação “Best of Bossa Nova- 75 classic hits”, recentemente editado em todo o Mundo e que nos proporciona uma visão detalhada e extremamente abrangente do movimento musical  que percorreu os lugares cimeiros das mais diversas tabelas de vendas de discos e durante muito tempo motivou acesas discussões, grandes  controvérsias e foi até factor de divisão de opiniões, para afinal de contas no final acabar a unir vontades e vozes e conseguir reunir uma quase geral unanimidade.

Fantásticas vozes do país verde-amarelo como as de João Gilberto, Sylvia Telles, Elizete Cardoso, Maysa, Vinicius de Moraes, Dorival Caymmi, António Carlos Jobim, Luís Bonfá, Sivuca ou Sérgio Mendes, entre muitas outras, a que se devem adicionar muitas mais, especialmente as americanas atrás já citadas, encontram-se representadas nesta tripla compilação, onde através de uma totalidade de setenta e cinco composições podemos comprovar não só a excelência das melodias, mas também a grande qualidade e inspiração das letras que lhes servem de apoio literário; um projecto verdadeiramente excepcional que os amantes da MPB, e não só, receberão de braços abertos  e ouvidos bem atentos ou não fosse este projecto uma autentica dádiva dos…deuses da música!

3CDs Pimiento/Buena records/Distrijazz

 

DIANA KRALL

Não existirão certamente mais palavras elogiosas que não tenham já sido usadas pela critica ou pelos melómanos para enaltecer a obra e a voz de Diana Krall, talvez a mais sonante e bem sucedida cantora do panorama jazzístico mundial na actualidade e por isso mesmo é sempre muito difícil, aquando da publicação de um novo trabalho, encontrar os termos mais adequados para, quando é caso disso, a colocar nos píncaros e enaltecer o seu trabalho seja no capítulo vocal seja como instrumentista ou mesmo produtora, área em que ultimamente se tem sobremaneira notabilizado nos seus mais recentes projectos; isto pese embora certos puristas do jazz que sempre dizem não ser ele uma genuína interprete de jazz, mas sim uma cantora com influências jazzísticas…

“This dream of you” é o título do seu novo trabalho tendo a escolha do primeiro single dele extraído recaído numa versão de uma conhecida canção, que mais tarde se tornou um clássico de Irving Berlin -“How deep is the ocean”;  a trabalhar com o seu quarteto de músicos que inclui os seus já habituais comparsas John Clayton Jr (baixo), Jeff Hamilton (bateria)e Anthony Wilson (guitarra) o projecto revela-se mais uma grande obra da pianista, com esta a cantar melhor que nunca uma cuidada selecção de belas composições que acabam por fazer deste trabalho mais um imprescindível na sua discografia; para a elevada qualidade  instrumental e excelência sonora do projecto muito contribuíram os seus três habituais compagnons de route,  bem como alguns convidados de grande gabarito artístico com destaque para Russell Malone(guitarra), Christian McBride (baixo), Alan Broadbent (piano), Marc Ribot (guitarra) e Stuart Duncan (violino) a que a pianista/cantora juntou ainda todos os seus atributos musicais pessoais, para além das suas próprias opções como produtora, condimentos  que fazem deste novo trabalho, uma obra de invulgar qualidade que coloca esta laureada artista no topo das maiores preferências e popularidade mundiais ao mesmo tempo que  fazem dela cada vez mais, quer os chamados puristas da grande música negra queiram, quer não, um caso sério no jazz vocal mundial actual!

CD Verve/Universal Music

 

CHET BAKER

Mais uma obra relevante do grande trompetista de jazz Chet Baker- “Sings and plays” , um disco originário de 1959 das suas celebres gravações em Milão, que possuindo na sua edição original apenas onze composições surge nesta nova versão com mais nada menos de nove temas extra, com destaque para três diferentes versões do célebre “My funny Valentine”, o que faz angariar para este trabalho também um acrescentado e inegável valor de colecção; aqui Chet surge a tocar e a cantar acompanhado por uma big band– a Len Mercers orchestra , para além duma série de convidados famosos dentre os  quais merecem saliência nomes como os de Gerry Mulligan, Bud Shank, Russ Freeman, Kenny Drew ou Jimmy Bond .

Para além de este projecto constituir um lançamento de edição limitada surge no entanto com outros aliciantes:- uma excelente remasterização, um novo alinhamento e um booklet revisto e aumentado o que faz ainda mais subir o seu valor intrínseco, isto para alem da altíssima qualidade de que sempre se revestem todos os trabalhos deste exímio trompetista e cantor , sem dúvida nenhuma uma das mais notáveis e insignes figuras do jazz mundial de sempre!

CD American jazz classics/Distrijazz

 

DIRE STRAITS

Quem não se lembra de alguma vez ter dançado ao som do extraordinário tema  “Sultans of swing” que tenha a coragem de pôr a mão no ar!

Pois é:- toda a gente levantou o braço em sinal de claro assentimento de que esta canção faz parte do imaginário de cada um e simultaneamente da banda sonora da nossa vida…

Com efeito, este verdadeiro hino de discotecas, que fez furor há uma série de anos atrás, é uma das canções responsáveis por um verdadeiro fenómeno de massas:- mal começavam a ser escutados os primeiros acordes, a canção levava toda a gente a saltar de imediato dos seus lugares nas discotecas da moda para de seguida positivamente conseguir num ápice esgotar a lotação da pista de dança; pelo menos comigo e com os meus amigos e irmãos de folias e noites bem acompanhadas, bem passadas e muitas vezes até etílicamente bem regadas -Raul Durão, João Filipe Barbosa e Fernando Balsinha (trio que infelizmente já não está entre nós) e nossas respectivas acompanhantes femininas, era assim que acontecia especialmente no celebre Ad Lib e também na  famosa discoteca dançante A Primorosa de Alvalade, ali na Avenida Estados Unidos da América, em Lisboa, sendo na altura esta canção a verdadeira “rainha” das loucas noites dançantes, ao mesmo tempo que por todo o Mundo fazia delirar multidões e era também top one nas rádios mundiais!

Este verdadeiro hino musical, juntamente com mais um quase infindável numero de outros grandes sucessos radiofónicos da banda, alguns deles verdadeiramente a  uma  escala quase planetária, fazem parte dum projecto agora editado e que reúne numa única caixa os seis discos de originais de estúdio de um grupo que durante a sua existência fez escola e esgotou centenas de concertos (Portugal incluído) em estádios e festivais um pouco pelos quatro cantos do Globo- os Dire Straits.

Capitaneados pelo insigne compositor, cantor e instrumentista Mark Knopfler, que fazia do seu instrumento- a guitarra, a fiel companheira dos delírios dançantes, os Straits, foram na realidade um caso de estudo e também de extraordinária popularidade a que não foram alheios os solos gigantescos e grandiosos do guitarrista, quer em disco, quer nos diversos espectáculos ao vivo a começar pelo de “Sultans…”, verdadeiramente mágico, quase hipnótico e extraordinariamente envolvente…

Na caixa vamos encontrar, ao longo dos citados seis discos de originais, editados no período de 1978 a 1991 e todos eles multi-platinados,  muitos hits massivos tais como o porta-estandarte “Sultans of swing” e ainda outros mais como “Tunnel of love”, “Once upon a time in the west”, “Lady writer”, “Solid rock”, “Romeo and Juliet”, “Private investigations”, “Walk of life”, “Money for nothing”, “Brothers in arms” ou “Calling Elvis”, afinal de contas autenticas pérolas musicais de uma banda que se cotou como uma das maiores e mais influentes do mundo do pop/rock mundial!

Este extraordinário espólio  surge numa atractiva caixa especial de seis CD´s de edição limitada e inclui uma série de extras como novas fotos, todas as letras das composições, replicas em vinil e  ainda um poster; por isso, para admiradores da banda e não só, constitui um fantástico e obrigatório objecto de colecção!

Caixa de 6 CDs Mercury/Universal Music

 

GREGORY PORTER

Aí está de novo a grande sensação vocal da musica negra de expressão soul dos últimos tempos – Gregory Porter; com  efeito acaba de se publicar um novo trabalho, o sexto de grande fôlego, que marca o seu regresso aos temas originais, onde o expressivo cantor negro tem mais uma prestação brutal e arrasadora, cantando como só ele sabe uma mão cheia de composições que facilmente nos deixam com pele de galinha, face à beleza, emoção e alta qualidade das suas interpretações.

Um disco fabuloso, de título genérico  “All rise”, onde podemos encontrar 13 novas e brilhantes canções, em que cada uma delas nos conta uma história diferente e através das quais Porter demonstra a toda a gente e em especial àqueles que em principio tiveram dúvidas do seu sucesso, porque é hoje em dia considerado um dos reis da musica de inspiração soul, um artista que sempre se supera e demonstra em cada interpretação ser cada vez mais emotivo, mais universal, mas acima de tudo que canta como ninguém de um modo cada vez mais visceral, transformando cada composição num inequívoco momento de rara  beleza vocal e acima de tudo dando a crer que o seu crescente progresso pessoal ainda está longe de atingir a plenitude, pois demonstra também neste novo projecto uma evolução artística e um apurado sentido estético e técnico realmente só ao alcance dos eleitos, dos predestinados e das maiores vozes da actualidade!

Misturando na perfeição jazz com soul, com blues e com gospel a que umas pitadinhas de pop/rock dão por vezes um sabor especial e um sublime encanto, o cantor, que toda a critica já considera um verdadeiro furacão musical,  prepara-se para em breve se transformar num extraordinário fenómeno de audiências  e popularidade; as suas próprias qualidades vocais intrínsecas assim deixam antever…

CD Blue Note/Decca/Universal music

 

MARIA JOÃO

É uma cantora verdadeiramente inebriante, intemporal, vocalmente soberba e acima de tudo uma interprete que se entrega de alma e coração ao que canta, seja de que género for a composição que lhe confiem pois ela transforma-a a seu bel-prazer com a sua maneira única e sui-generis de cantar e dar vida a composições que não sendo suas, passam a sê-lo depois de ela as interpretar…

Em “Open your mouth”, o seu novo projecto onde surge pela terceira vez  com a companhia dos Ogre Electric com quem esgrime talento e diversidade Maria João atinge uma verdadeira plenitude vocal, chega-se e adere em definitivo ao campo da electrónica, sem que esta prejudique de nenhuma maneira a sua linguagem vocálica, isto quando em muitos dos trabalhos anteriores o lado acústico era por demais preponderante e activo.

E se ao longo das ultimas décadas  se tem verificado que a cantora sempre tem arriscado imenso, através e na companhia das mais diversas ligações a estranhas áreas instrumentais e rítmicas e segundo os ditames das mais complexas e diversas experiências, muitas vezes num verdadeiro e arriscado trabalho que se pode considerar verdadeiramente sem rede em que a linguagem jazzística, afinal o ponto de partida para a sua brilhante carreira, foi várias vezes abandonada em detrimento de grandes e por vezes complexas experiências vocais e sonoras, mantendo no entanto a cantora toda a sua natural musicalidade, agora nota-se que está bem mais segura do que pretende fazer e do caminho a seguir, pelo menos num futuro próximo, continuando assim igual a si própria e, parece-me, com um entusiasmo crescente e  contagiante…

Com efeito, neste momento a cantora parece estar de novo num outro capitulo da sua carreira e num diferente patamar, em plena mutação, estado que afinal e habitualmente tem pautado os seus mais diversos trabalhos, em que, mudança atrás de mudança, significava para além duma insatisfação pessoal e temporal, um sinal de inquietude e ao mesmo tempo um desejo de evidente  comunicação e transformação, usando para isso como veículo os seus extraordinários dotes e capacidades vocais, bem como a sua faceta pessoal de compositora e dando assim, ao mesmo tempo, um novo significado e sentido ao dom com que Deus a contemplou  e lhe permite ser e constituir-se, desbragadamente arrojada e especialmente diferente de tudo e de todos, usando como condimentos, e a seu bel-prazer, uma incrível vitalidade, grande  inspiração, uma extraordinária sofisticação e uma linguagem próprias, predicados que sem duvida lhe continuam a garantir na actualidade um lugar exclusivo e privilegiado no mundo das maiores vozes femininas portuguesas e mundiais…

CD Membran

 

HÈLÉNE GRIMAUD

Através do seu instrumento e acompanhada pela célebre Camerata Salzburg, a insigne pianista Hèléne Grimaud cria um fantástico, fascinante  e inimaginável duelo em que põe frente a frente a musica de  dois dos compositores que desde sempre mais admirou- a de Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) e a do compositor ucraniano Valentin Silvestrov, propondo-nos um disco absolutamente intemporal, introspectivo e mágico- “The Messenger”- em que o seu virtuosismo inventivo e de execução estão por demais evidentes e onde demonstra à saciedade todas as suas extraordinárias capacidades interpretativas, afinal de contas os predicados  que sempre a tem feito evidenciar-se desde o seu primeiro disco ao mesmo tempo que destila uma qualidade impar que tem servido como um perfeito  cartão de visita, afinal um predicado que sempre tem revelado e fazem dela umas das maiores e mais intensas executantes da sua geração.

 

CD Deutsche Grammophon/Universal Music

 

BADEN POWELL

De seu nome próprio Baden Powell de Aquino, mas mais conhecido no mundo musical simplesmente por Baden Powell (1937-2000), foi um genial compositor e interprete brasileiro que fez da sua guitarra a companhia ideal para se projectar e deleitar audiências não só no seu Brasil natal, mas também um pouco por todo o Mundo por onde espalhou a sua arte de inspirado compositor e genial interprete, tendo sido mesmo considerado pela critica e pelo público em geral um dos mais talentosos e brilhantes executantes de guitarra, isto  graças ao facto de possuir uma técnica incomum onde esta casava na perfeição com as suas harmonias e um swing  brilhante, tendo ficado famosas algumas das suas pessoais versões que acabavam por dar às composições uma espécie de segunda vida; foi o caso por exemplo de sucessos como “Garota de Ipanema”, “Samba triste” ou “Berimbau” que acabaram por se transformar em verdadeiros clássicos.

Do instrumentista brasileiro acaba de surgir um trabalho inédito que engloba dois dos seus mais carismáticos discos:- ”Á vontade + Swings with Jimmy Pratt” , onde no meio de uma lista de 20 composições surgem também as três já atrás citadas alem de “Saudades da Bahia”, ”O astronauta” ou “Conversa de poeta” e ainda uma fantástica e invulgar versão do celebre “Samba de uma nota só” que durante muitos anos funcionou assim a modos que um cartão de visita do genial instrumentista; um combo absolutamente imperdível que surge numa edição limitada a 500 cópias havendo ainda a particularidade de se tratar de uma edição contendo um novo booklet com  novas notas biográficas.

CD Aquarela do Brasil/ Distrijazz

 

RUDOLF BUCHBINDER-outra vez Beethoven

É considerado unanimemente pela critica especializada mundial, e pelo público em geral também, uma autoridade em matéria de música de Beethoven e por isso mesmo qualquer edição de gravações suas sejam registadas ao vivo ou em estúdio versando este tema é sempre motivo de grande interesse e certo entusiasmo; isso mesmo acontece agora com a recente edição de ”Beethoven – piano concerto nº 1” , obra registada ao vivo, em que o conceituado pianista demonstra não só toda a sua enorme criatividade, mas também uma grande  versatilidade e talento.

Sob a condução de Christian Thielemann a famosa Orquestra Filarmónica de Berlim é no caso presente o veículo ideal para o pianista, nascido na Áustria, brilhar a grande altura, demonstrando a todos porque é considerado um dos maiores executantes do mundo na arte das teclas acústicas; projecto de grande sensibilidade e rara intuição traz ainda como bónus uma peça de grande beleza com Rudolf a conseguir extasiar os melómanos numa virtuosa interpretação (inédita) da peça “Variations on an original theme in F major – opus 34” também da autoria do mesmo génio alemão – Ludwig van Beethoven  (1770-1827) onde toda a sua arte vem ao de cima numa demonstração clara e absolutamente inequívoca de estarmos em presença de  uma autoridade em matéria de obras do famoso compositor alemão de quem aliás o pianista austríaco já se tornou mesmo uma verdadeira referência!

CD Deutsche Grammophon/Universal Music

 

JOÃO GILBERTO-chega de saudade

Se há uma composição que imediatamente seja associada ao grande João Gilberto, nome imortal da musica popular brasileira, um dos seus mais lídimos expoentes e sem dúvida alguma o nome mais incontornável da música que se fazia no País verde-amarelo  nos anos 50 e 60, é sem dúvida “Chega de saudade” canção que alcançou tal sucesso de vendas e popularidade que se transformou pouco a pouco num autentico “hino” para todas as idades; esta mesma composição acabou mesmo por registar um recorde deveras assinalável de versões e novas interpretações um pouco Ora este mesmo sucesso acaba de aparecer agora incorporado numa compilação com o mesmo nome a que se adicionaram nada menos de mais 38 temas, também da área da bossa nova, e onde podemos encontrar, entre outros, mega-êxitos como “Desafinado”, “Maria ninguém”, “Manhã de Carnaval”, “Samba da minha terra”, “O barquinho”, “Corcovado”, “O pato”, “Samba de uma nota só” ou “Insensatez”,  num  desfilar continuo de melodias únicas e inesquecíveis que acabam por constituir um raro e invulgar numero de interpretações na voz do grande interprete, num projecto que surge em edição limitada, remasterizado no sistema 24 bit, e que assim acaba por se tornar um objecto extremamente  apetecível e de compra mais que obrigatória especialmente por parte do melómanos que fazem do famoso ritmo brasileiro uma das suas preferências musicais, tanto mais que a colectânea tem uma cuidadosa selecção musical e as canções  têm arranjos e condução musical do grande e imortal António Carlos Jobim.

Que grande disco! Absolutamente  imperdível e uma prenda natalícia impar e deslumbrante!

CD State of Art records/Distrijazz

 

DAVE BRUBECK – ao vivo!

Mais um lançamento de luxo na área da grande musica negra:-“Dave Brubeck Quartet  at Oberlin & Wilshire-Ebell” projecto que retrata duas grandes prestações musicais integradas numa, agora já mais habitual e mesmo corriqueira, mas na altura invulgar digressão da banda por famosos colégios e Universidades dos Estados Unidos, tendo sido mesmo uma delas considerada uma das mais famosas performances do quarteto do grande pianista de jazz; os concertos que remontam a 1953 foram mais tarde editados sob a forma de 2LP´s e tiveram lugar, um no conservatório da  Universidade de Oberlin, no Ohio e outro no de Wilshire-Ebell College, isto numa altura em que o quarteto brilhava a grande altura e era constituído pelo próprio Brubeck, no piano, Ron Crotty, no baixo, Lloyd Davis, na bateria e  o grande Paul Desmond no saxofone alto.

O compact disc em que figuram essas prestações ao vivo acaba de ser agora editado e traz consigo uma novidade que para os fans e para os muitos coleccionadores promete ser deveras entusiasmante:- pela primeira vez surge em formato CD a composição “The way you look tonight”, que nos proporciona a audição da versão integral do já lendário solo de saxofone de Desmond, em toda a sua surpreendente magnificência, numa prestação absorvente e esteticamente perfeita, que acabaria por ser considerada como histórica e sem dúvida acabou marcada a letras de ouro na história do jazz…

Uma hora e um quarto de puro deleite e prazer musical, que tornam esta edição da série  “2LPs on 1CD” num verdadeiro objecto de culto e onde não faltam também outros  atractivos:- surge em edição limitada, com um renovado booklet que contempla novas notas biográficas e em edição digitalmente remasterizada.

CD American Jazz Classics /Distrijazz

 

NOTÍCIAS SOLTAS

LINA & RAUL REFREE – galardão

O álbum homónimo da dupla Lina & Raul Refree foi recentemente considerado o álbum do ano para a prestigiada World Music Charts Europe, tendo esta posição sido escolhida pelos profissionais de rádio de 24 países europeus, que compõem o WMCE, num total de 708 nomeações para um ranking de 200 álbuns.

Entretanto a dupla terminou recentemente uma bem sucedida digressão europeia de 2020  com um concerto de lotação completamente esgotada no L’Auditori de Barcelona.

A digressão será retomada já em Janeiro próximo com a atuação no Festival Eurosonic, na cerimónia de anúncio dos vencedores do Music Moves Europe Talent Awards 2021 e continuará depois com os seguintes concertos já confirmados:

6 de março – Cankarvej – Liubliana, Eslovénia

29 de março – Ancienne Belgique – Bruxelas, Bélgica

3 de abril – Theatre Bezons – Bezons, França

7 de maio – La Linea Festival – Londres, Inglaterra

27 de julho – Festival Músicas do Mundo – Sines, Portugal

 

KATIA GUERREIRO – 20 anos de fado

Katia Guerreiro regressa a Lisboa em nome próprio, num espectáculo que inicialmente esteve marcado para 12 de Dezembro mas que a maldita pandemia obrigou a adiar para 18 de Março de 2021; o espectaculo iniciar-se-à pelas 20 horas e  tal com o inicialmente estava previsto terá lugar no Teatro Tivoli BBVA, na Avenida da Liberdade, na capital portuguesa, evento onde irá recordar  e simultaneamente comemorar alguns dos momentos mais importantes e entusiasmantes da sua carreira de brilhante  fadista.

Este espectáculo contará  com a participação instrumental dos músicos Pedro de Castro e Luís Guerreiro, ambos em  guitarra portuguesa, André Ramos e João Mário Veiga , nas violas de fado e Francisco Gaspar em viola-baixo, para alem de alguns convidados que serão anunciados brevemente.

Face à alta qualidade de que sempre se revestem as suas actuações será certamente um acontecimento a recordar!

 

FREDERICO BC – ao vivo no Casino – 26-Fevereiro-2021

Considerado um dos mais jovens valores da musica portuguesa Frederico BC ao mesmo tempo que prepara o lançamento daquele que será o seu terceiro disco de originais, vai actuar no Casino, onde irá interpretar canções dos seus dois álbuns anteriores e destapar um pouco o véu quanto a temas do próximo disco; entretanto a RTP lançou na sua nova plataforma RTP-Palcos um documentário sobre o último disco do cantor, que mostra os bastidores de todas as gravações deste álbum que conta com mais de meia centena de pessoas envolvidas.

XUTOS & PONTAPÉS – comunicado

“Estamos a fazer todos os possíveis para manter a data de dia 13 de Março para o nosso anunciado oncerto “Xutos e Pontapés com a Orquestra Filarmónica Portuguesa”, no Altice Arena; contudo, sabemos que estes são tempos de incertezas, por isso decidimos dar aos nossos fãs a possibilidade de reaverem o dinheiro dos bilhetes para este concerto, caso não queiram ou não possam esperar pela nova data do concerto que, podem ter a certeza, se vai realizar!

Entendemos que muitos de vós possam estar a passar momentos difíceis, mas acreditamos que nos vamos voltar a reencontrar! (Xutos & Pontapés)Entretanto, quem desejar a devolução deverá solicitar a mesma junto do ponto de venda onde adquiriu o seu bilhete.

 

JAZZ MESSENGERS

Programada para ser inaugurada com alguma pompa e circunstância um pouco antes da chegada da maldita pandemia que há meses nos assola e sua posterior e obrigatória confinação,  a nova loja de discos  Jazz Messengers, depois do adiamento da sua inauguração já labora agora a todo o vapor no primeiro andar da Livraria Ler Devagar, na LX Factory ali na ribeirinha zona de Alcântara, em Lisboa;  aquando do anuncio da sua abertura o novo espaço discográfico tinha já suscitado grande interesse e curiosidade e porque não dizer mesmo certo entusiasmo por parte não só do público em geral, mas também de especialistas e melómanos  do jazz e do vinil e também ainda dos fanáticos do catalogo da ECM, que os há e muitos…

Agora e depois das primeiras visitas posso dizer que o espaço funciona assim a modos que uma grande biblioteca musical, virada sobretudo para as áreas do jazz e do vinil, constituindo sem dúvida nenhuma neste momento a mais válida alternativa às fnacs,  sobretudo porque tem a vantagem de ter à frente do “balcão” gente com certa experiência e uma imensa paixão e que sabe da poda – a front woman Carla Aranha , Luís Oliveira  durante a semana e Samuel Alemão , aos fins de semana…

O trio  dos “mensageiros” da grande musica negra aconselha com critério e rigor os indecisos e acima de tudo dedica ao cliente o melhor do seu conhecimento e labor e, sabendo-se que muita da clientela já adquirida e grande parte da futura se baseia também em turistas estrangeiros, imagine-se como esse “know how” se torna mais essencial, importante  e vital !!!

Associada a uma importante editora catalã, cujas edições aqui tenho  referenciado nas escolhas  que faço – a Distrijazz, este novo espaço comercial aposta também em edições portuguesas, em música  brasileira (vidé as minhas habituais e mais recentes escolhas da área da  MPB e não só)) e também em música soul, funk ,em alguma world music e como não poderia deixar de ser no jazz e nos blues.

Curiosamente o feliz nome escolhido para o espaço- Jazz Messengers  traz-me de imediato à lembrança a célebre formação com o mesmo nome, surgida por alturas dos anos 50, do grande e mítico baterista de jazz Art Blakey, que constituiu uma das mais importantes formações jazzísticas de sempre por onde passaram alguns nomes imorredouros tais como Horace Silver, Lee Morgan, Donald Byrd, Valery Ponomarev, James Williams, Johnny Griffin, Wynton Kelly, Benny Golson, etc. qualquer um deles representado no vasto reportório discográfico posto à disposição da clientela nos vários escaparates existentes na loja…

Depois do encerramento da loja da Trem Azul, em 2014, a capital portuguesa tem agora, finalmente, e de novo, um espaço dedicado essencialmente ao jazz e aos seus afluentes sonoros e musicais – a Jazz Messengers que, com armazém na vizinha Espanha, tem também acesso a importações directas desde os Estados Unidos e a algumas das mais influentes distribuidoras e editoras (ECM.,Tzadik, etc.) e por isso mesmo vai evitar que, como tem infelizmente sucedido nos últimos anos, nomes como John Coltrane, Ray Charles, Max Roach, Charles Mingus, Bill Evans, Thelonious Monk ou Sun Ra e muitos outros estejam permanente e inacreditavelmente ausentes dos escaparates portugueses e muitas das vezes para os obter haja que recorrer à inevitável Amazon…

Posto isto vamos então comemorar efusivamente o verdadeiro acontecimento musical e cultural que esta abertura representa, tratando para isso de tirar do frigorifico as várias garrafas de champagne que estavam destinadas à inauguração em Março passado e brindar entusiasticamente ao novo espaço, aos seus experts e acima de tudo ao fim da pandemia  e  consequentemente ao covid 19 para isso possibilitar a todos voltarmos à ansiada vida normal com um sonante hip, hip, hurrah!  e acima de tudo voltarmos  em liberdade não confinada a consumir cultura, comprando livros e discos nestes dois espaços lisboetas soberbos e chamativos:-a Ler Devagar e a Jazz Messengers .